Na cidade de Fragária, sob o domínio da República, a magia é proibida, e Amarílis conhece como ninguém o perigo de quebrar as regras. Para evitar o destino trágico que teve sua mãe, a jovem tecelã mantém a cabeça baixa e os fios de seus poderes bem amarrados.

Quando, por acaso, se vê diante do homem que causou a ruína de sua família, Amarílis decide convocar um demônio e fazer um pacto: ela quer a morte do general que destruiu sua mãe. Mas sua oferenda é muito simples, e Tolú, o Antigo que atende seu chamado, não pode tirar uma vida por um preço tão baixo. Ele pode, porém, ajudar Amarílis a enfrentar seus medos enquanto ela faz justiça com as próprias mãos.

O substantivo demônio é mais conhecido na literatura como uma entidade ligada à religião. Um anjo caído, expulso do paraíso, que se rebelou contra Deus e passou a lutar contra a humanidade. Entretanto, o substantivo vem de bem antes e é usado em várias mitologias. Em algumas delas, é um ser de poder limitado que pode induzir as pessoas, tanto para o bem, quanto para o mal. Tolú, o demônio de MARIPOSA VERMELHA, é esse segundo tipo, sem qualquer conexão com religião, pelo menos neste primeiro volume.

Essa decisão se mostra acertada, uma vez que Tolú conquista o interesse amoroso de Amarílis, e penso que seria problemático colocar uma pós-adolescente se relacionando sentimentalmente e sexualmente com um ser religiosamente maligno e que se coloca contra Deus e a humanidade. Assim, Tolú é apresentado apenas com um ser antigo, com algum poder, que consegue se metamorfosear em um homem de aparência linda, um conquistador, que induz as pessoas a fazerem o que ele deseja, dentro de um limite de persuasão. Ele é uma criatura presa em outra realidade, uma espécie de Limbo, apenas à espera de ser invocado para desempenhar alguma tarefa para a pessoa que o chamou. Através dessas missões, ele consegue estar no mundo real com todos os prazeres que este proporciona e não em um deserto sem vida.

Quando criança, Amarílis perdeu sua mãe, seu irmão, sua casa, tudo por conta da crueldade e ambição de um homem de quem ela nunca viu o rosto, uma vez que a mãe a escondia dentro de um armário, quando o homem as visitava. Agora, já adulta, ela trabalha em uma fábrica de tecidos, é uma hábil costureira que tece os fios fabricados pelo bicho-da-seda, um inseto da família das mariposas, que passa por um processo de metamorfose e produz um nobre e cobiçado fio para construir um casulo que o protege durante o processo. Mas Amarílis é muito mais do que uma tecelã, ela possui uma gigantesca quantidade de magia dentro de si, dormente, escondida, à espera de se manifestar.

Na fábrica, Amarílis reencontra o homem que matou sua mãe. Assim, ela decide, finalmente, perpetuar sua vingança. Para isso, ela usa sua magia para invocar um demônio, Tolú. Ele será sua arma, ou sua ponte, para a construção de um plano que culmine na morte de seu algoz. Mas durante o desenvolvimento desse plano, e diante de situações em uma sociedade corrupta e ditatorial, Tolú e Amarílis se apaixonam. Como manter uma relação entre dois seres tão diferentes? Uma humana, mesmo dotada de grande poder mágico, consegue amar uma criatura que, na sua forma original, é monstruosa? São perguntas já respondidas por vários outros livros.

MARIPOSA VERMELHA reúne várias ideias de histórias conhecidas. E elas são facilmente identificáveis durante a leitura. A mais óbvia é a inspiração em CORTE DE ESPINHOS E ROSAS, que, por sua vez, se inspirou em A BELA E A FERA. MARIPOSA VERMELHA tem trechos bastante parecidos, inclusive a parte em que Amarílis e Tolú se relacionam sexualmente. Já seus pensamentos diante da incompatibilidade física e do perigo do ato sexual é muito, muito semelhante a uma outra obra, CREPÚSCULO. Aliás, tem um diálogo que remete ainda mais a esse livro. Tolú basicamente avisa, da mesma maneira que Edward, como ele é forte, poderoso e perigoso para a integridade física de Amarílis, e ela, da mesma maneira que Bella, responde que não tem problema. Quando li, achei graça em como o tempo passa e as garotas de alguns livros continuam meio suicidas pela paixão de um homem.

Mas existem outros trechos familiares. A parte em que Amarílis precisa fazer uma roupa para causar impacto em uma festa, diante de uma sociedade corrupta e imprevisível, se assemelha muito a quando Katniss usa suas roupas na apresentação dos tributos diante da Capital em JOGOS VORAZES. E o mundo em que Amarílis vive, de certa maneira, com toda a magia e perseguição, lembra bastante o mundo de SOMBRA E OSSOS. Mas esse mundo e toda a opressão que é mencionada durante a história, fica apenas entre diálogos e sugestões, nunca chegamos a ter detalhes ou acompanhar alguma informação mais profunda. O foco principal é mesmo o romance e a vingança, nessa ordem.

Apesar dessas inspirações, e dos problemas que algumas delas representam, como diferença de idade, personagem feminina com dependência emocional e psicológica de um homem, e dos clichês de um personagem masculino de aparência maléfica, mas com coração de ouro, e da garota que faz tudo por ele, mesmo contra toda a lógica, a narrativa de MARIPOSA VERMELHA é uma leitura divertida, desde que o leitor abstraia esses problemas. A trama consegue gerar suspense, a relação dos dois personagens, diante do clímax que se apresenta, traz interesse, e o final deixa um gancho, mesmo que um pouco forçado e sem sentido, para gerar ansiedade diante da espera de uma continuação. Ah, sim, tem continuação.

Entretanto, por se tratar de uma obra nacional, lamento que a maioria das ideias sejam inspiradas em obras tão problemáticas. Existem fantasias nacionais que trazem aventuras similares, mas com menos problemas, e esta tinha tudo para se juntar a elas. Agora se você é fã de CORTE DE ESPINHOS E ROSAS, CREPÚSCULO, SOMBRA E OSSOS, ou outros similares, com certeza vai amar MARIPOSA VERMELHA.


AVALIAÇÃO:


AUTORA: Fernanda Castro
EDITORA: Suma
PUBLICAÇÃO: 2023
PÁGINAS: 272