Tem um filme maravilhoso na Netflix que merece a mesma atenção que títulos como BARRACA DO BEIJO e CAIXA DE PÁSSAROS receberam: O QUE FICOU PARA TRÁS, uma produção indie-britânica que trás muito da cultura africana para as telas. Temos aqui um terror psicológico, potente, impactante e extremamente original. Quer saber mais? Chega ai!

O filme acompanha um casal que acabou de chegar no Reino Unido, estão como refugiados que fugiram de um conflito no seu país natal na África. Eles são aceitos pelo governo britânico e logo recebem uma casa para morar. Porém, a casa é extremamente velha, suja e danificada, eles tem poucos recursos para a reforma e talvez nem tenham cabeça para fazer coisa alguma, já que ambos tenham vencer o trauma de abandonar sua própria terra e também chorar pela criança que estava na fuga com o casal e não sobreviveu à travessia para a Europa. As coisas pioram quando ambos começam a ver coisas estranhas na casa, vozes esquisitas e presenças assustadoras. Algumas vozes e rostos são familiares, tem algo acontecendo ou eles estão enlouquecendo?

Já começo falando que estamos diante de um dos melhores filmes do ano, que exala riqueza, cultura e profundidade. Tudo isso numa produção que, sem dúvidas, teve um orçamento minúsculo. A trama segue esse casal tentando encontrar uma nova vida nessa nova terra, ao mesmo tempo em que precisam vencer o preconceito dos outros por serem negros e refugiados. Enquanto lidam com isso, também precisam entender o que raios são essas presenças estranhas na casa, algumas que lembram a criança que morreu, querem a morte do casal, enlouquecer os mesmos ou até mesmo fazer promessas a ambos. É muita coisa para se processar e o filme apresenta cada novo arco com muita calma e maestria.

São basicamente dois personagens durante todo o filme e a interação entre eles é o que move a trama, que trás elementos culturais africanos extremamente interessantes para debate. É, sim, assustador, mas ao mesmo tempo doloroso, físico, como emocionalmente. Os personagens estão destroçados e frágeis, como vencer tudo isso? O público vai à loucura vendo e não podendo ajudar. Uma trama rica, grandiosa e honesta. Muito difícil não se impactar ou emocionar.

O elenco entrega desempenhos formidáveis, Wummi Mosaku se destaca num nível que até mesmo quem não gostar do filme, não pode dizer que a atriz não está extraordinária em cena. Um rosto conhecido que tem um pequeno papel no filme BATMAN VS SUPERMAN, assume aqui o mando de protagonista com muita forma. Ele não precisa de muitos diálogos, seu rosto, seu olhar cortam o espectador com muita dor e lamento, de longe uma das melhores atuações do ano. Sope Dirisu também merece destaque, ele vive aquele personagem que comeu o pão que o diabo amassou. Aproveitando todo esse sofrimento, o ator entrega cenas de tirar o folego em sequências fortes e apavorantes. Um olhar também muito impactante e doloroso. Matt Smith, das séries DOCTOR WHO e THE CROWN, tem uma pequena participação que também merece destaque, o ator é aquele britânico da gema que arrasa em qualquer personagem que assume.

E não satisfeito com um roteiro incrível, uma direção fantástica e um elenco afinado, o longa ainda se revela um dos mais lindos visualmente do ano. A fotografia faz contraste entre uma terra fria e suja, com um mundo rico e exótico, criando cenas dignas das maiores e mais belas pinturas. A trilha sonora arrepia e os efeitos visuais, que na maioria das vezes são práticos, provam que pra se construir um bom filme, não precisa de rios de dinheiro.

O QUE FICOU PARA TRÁS assusta na mesma proporção que emociona. Uma história, nova, rica, potente e importante. Com uma representatividade mais que necessária para o momento em que vivemos. Um filme grandioso que merece ser descoberto.


DIREÇÃO: Remi WEEKES
DISTRIBUIÇÃO: Netflix
DURAÇÃO: 1 hora e 33 minutos
ELENCO: Wummi MOSAKU, Sope DIRISU, Matt SMITH