Quando finalizei a leitura de RIO VERMELHO, fiquei algum tempo digerindo o que havia lido. Não foi muito fácil tentar compreender a história. Isso porque os três personagens principais são doentes. Não fisicamente, mas psicologicamente. E essa construção é muito bem feita, o que explica o motivo de o livro ser premiado. A autora demonstra conhecer vários lados da psique humana que transmitem repulsa e medo.
Nos EUA, Dennis foi preso pelo assassinato de uma garota de onze anos, e é suspeito do desaparecimento de várias outras. Ele está no corredor da morte, mas devido a um processo judicial mal conduzido, provas inconsistentes, testemunhos duvidosos e à sua constante afirmação de que é inocente, é formada uma legião de fãs que lutam pela revisão de seu julgamento e por sua liberdade. Entre esses fãs, está Samantha, uma inglesa que fica obcecada por toda a história de Dennis, a ponto de criar coragem e enviar uma carta para ele. Assim, os dois começam um relacionamento à distância, que resulta em trocas de juras de amor e na ida de Sam para os EUA, com o objetivo de conhecê-lo pessoalmente e ser mais ativa na tentativa de sua liberdade.
Não é spoiler dizer que ela consegue, uma vez que isso acontece já no início do livro. Os dois se casam e, após a morte do pai de Dennis, eles partem para a cidade natal dele, para o enterro e para resolverem o que fazer com a casa da família. Lá, Sam conhece Lindsay, uma amiga de Dennis, e esse relacionamento traz consigo várias descobertas sobre a verdade de toda a história.
Dennis é doente por diversos motivos. Ele sofreu abusos na mãos do pai bêbado e não teve uma mãe presente, uma vez que ela vivia drogada. Maltratado, vivia com fome, roupas sujas, era o pária da escola, mas era bonito, e isso evitava que fosse marginalizado por todos. Mas seu comportamento sempre foi duvidoso, uma vez que era constantemente pego roubando e observando criaturas mortas.
Lindsay também era uma garota problemática. Apaixonada por Dennis, foi rejeitada por ele e acabou ocupando o lugar de melhor amiga. Eles cultuam um relacionamento estranho, cheio de segredos, que por vezes parece ser íntimo, mas não em termo sexuais, mais como se fossem irmãos. Ela não liga para ninguém além de Dennis, nem para seu filho, e é tão desleixada e rude quanto ele.
E tem Sam, a personagem principal. Ela tinha uma vida normal na Inglaterra, mas era dona de uma autoestima totalmente destroçada, não em relação à sua aparência, mas, sim, sobre seu futuro, seu lugar no mundo, na sua necessidade de ter a total atenção de alguém. Por causa dessa carência, ela se envolve com Dennis, mesmo ele sendo um presidiário, mesmo sendo um condenado à morte, mesmo sendo suspeito de matar várias garotas. Ela não acredita em nada disso, ela enxerga apenas alguém de quem ela pode cuidar e que pode retribuir com o amor que ela não recebe de mais ninguém.
Eu, no início, não compreendi onde a autora queria chegar com o comportamento de Sam. Existe um problema narrativo na parte da troca das cartas. Sam acompanhava o caso de Dennis há muito tempo, lia tudo sobre o julgamento e assistia a todos os programas, então consegui aceitar a paixão que ela desenvolve por ele. Entretanto, Dennis confessa seu amor após a troca de apenas três cartas. Achei que não foi convincente, que ficou forçado e apressado, tanto da parte dele, quanto da parte de Sam em acreditar. Mas após metade do livro, compreendi porque ambos agiram dessa forma. E aí volto ao primeiro parágrafo, quando disse que os três são doentes.
Não importa o que Dennis faça, nem o quanto ele minta, nem quem ele seja de verdade, Sam só enxerga nele alguém estragado que ela pode cuidar e que pode ser sua companhia. Mesmo quando ele, após estarem casados, se recusa a ter relações sexuais com ela; mesmo quando Lindsay entra no relacionamento; mesmo quando ela encontra provas de coisas que ela pensava que fossem mentira; mesmo quando ela começa a temer pela própria vida; e mesmo quando ela descobre toda a verdade. Nada disso abala o que ela sente por Dennis. Nada disso importa. Na mente dela, e isso fica claro nas últimas páginas, Dennis existe para que ela cuide dele, para terem um relacionamento assexuado, separado pelos vidros da sala de uma penitenciária, porque assim ela pode receber a atenção e o amor que precisa, e ele não pode fugir disso.
Dennis e Lindsay são como se fossem apenas um. Ela é a motivação, ele é a consequência. Ela tem uma dívida de gratidão por ele, além do laço emocional, e ele vê nela a justificativa para fazer o que gosta de fazer. Ambos são nojentos, com uma mente amoral que não consegue distinguir o quanto suas ações são perversas. O bandido mais perigoso é aquele que não tem compreensão daquilo que perpetua, porque ele não hesita, ele simplesmente faz, sem remorsos, sem culpa. Até o final do livro, não sabemos quem Dennis é de verdade. Nem Lindsay. E quando a verdade aparece, ela não surpreende, porque até essa parte, acontecem tantas coisas dúbias, que eu só me senti aliviado por confirmar que ainda conseguia reconhecer quando uma pessoa era equilibrada e quando ela era totalmente doentia.
RIO VERMELHO é um livro muito bem escrito, com uma construção perturbadora da mente de pessoas estragadas. É uma história que incomoda, com um final que muitos podem não compreender, não porque seja complicado, mas porque representa a escolha de uma mulher, de Sam, que é emocionalmente incapaz de amar alguém que não seja tão doente quanto ela. Eu me senti nauseado. Mas também senti que havia terminado de ler um livro muito bom, porque apenas livros muitos bons conseguem afetar o leitor de forma a que ele não esqueça da história por um bom tempo.
AUTORA: Amy LLOYD
TRADUÇÃO: Carlos SZLAK
EDITORA: Faro
PUBLICAÇÃO: 2018
PÁGINAS: 276
COMPRAR: Amazon
Uma leitura indigesta. Não há outra palavra para definir essa leitura. Puxa, deu vontade reler..rs
Li ele já tem um bom tempo e realmente todos os personagens são doentes, mas juro pra você que quis entrar no livro e passar a cara de Sam no asfalto muitas vezes.
Ela é normal e ao mesmo tempo, um trem de outro mundo. Umas vezes dá vontade a abraçar e outras de a matar.
Preciso resgatar esse livro e ler ele outra vez!!!!
Uma excelente dia de suspense..e? Asco!rs
Beijo
Indigesta é uma ótima definição!
Uma história que aparenta ser aquele tipo de livro para duvidamos da nossa própria sanidade. Gosto de livros e assim e esse parece mexer com nosso psicológico. Um cara que gosta de criaturas mortas e que passou por uma vida difícil com seus pais sendo abusado pelo próprio pai. E meu Deus, muitas coisas acontecem só no começo pelo visto, ele trocando cartas de amor a distância, depois casando e tals. Parece ter um bom desenvolvido e aprimoramentos das personagens. Já havia visto esse livro e gostei muito da capa, pensava ser um Thriller mas é mais que isso. Espero poder ler algum dia
Perturbador!
E pensar que existem pessoas como Sam. Que por causa de problemas psicológicos se deixam enredar em tramas tão sombrias como em Rio Vermelho
É estranho me posicionar sobre este livro após a resenha. Eu gosto de livros assim misteriosos, que me passem sentimento e que tenhamos que descobrir qual a verdade por trás dos fatos. Mas não sei se nesse momento, estando todos um pouco emocionalmente abalados eu iria gostar e aproveitar a leitura. Fica a dica para um 2021 talvez …
Carl!
É bem assim mesmo…
Tive oportunidade de ler esse livro também e fiquei uns dias bem chocada, porque mesmo sabendo que existem pessoas ‘moralmente doentes’ e que foram ‘quebradas’ durante a infância e a vida, é deprimente ver uma relação como eles tinham, aliás, como os três tinham, algo entre o asco e o inimaginável.
cheirinhos
Rudy
Noossaaa! Eu já fiquei tensa só com a resenha, nem li e já estou pensando: “Que livrão!”
Esse livro com certeza vai para o topo da minha lista de desejados. Não vai ser uma leitura que vou fazer de imediato, por conta do momento que estou passando, mas com certeza é uma leitura que farei, pois é o tipo de leitura que eu amo.
Pessoas como os personagens do livro não vivem apenas na ficção, eles vivem aqui na realidade também e ás vezes estão bem próximos.
Eu sempre fico curiosa quanto a livros que mexem com o psicologico, nos fazendo confundir tudo. Ja tive muita vontade de ler esse livro, mas nao sabia muito sobre a premissa. Otimas considerações.
Oi ♡
Adoro livros que tratam de problemas psicológicos, mas nunca cheguei a ler um que tivesse tantos personagens com distúrbios.
Acredito que o maior desafio em ler esse tipo de história é tentar entender como os personagens se sentem a ponto de tomar determinadas decisões.
Realmente é um grande desafio…
Fiquei angustiado só imaginando o desenvolvimento de narrativa desse livro. Vi a capa de Rio Vermelho em alguns bookstagrammers, mas não me interessei em conhecer. Agora estou extremamente empolgado para a leitura e sobre todas as questões que ela parece levantar, principalmente com a tomada de decisões. Adicionei à lista!
Olá! Sam parece ser uma personagem daquelas que a gente sente pena e raiva. O livro traz uma leitura bem diferente das que eu estou acostumada e pelo visto vou precisar ter o estômago forte para poder seguir em frente, mas descobrir o desfecho desses três me deixou bem curiosa.
Oi, Carl
Fique namorando o livro por um bom tempo. Em maio ele estava na promoção e comprei, mas ainda não li porque tenho uma lista de atrasados.
Li várias resenhas, a sua é bem clara, sincera sobre o que encontrar nessa trama. Personagens desajustados, dependente como a personagem principal que aceita tudo é ainda não vê o traste que o marido é.
Beijos