John Clark é um jovem fotógrafo contratado pelo governo dos EUA durante a Grande Depressão para documentar as condições de vida no Dust Bowl, região dos Estados Unidos assolada por tempestades de poeira e degradação ambiental. Ao chegar, John se depara com a severidade da situação: famílias lutando contra a pobreza, fome e doenças causadas pelas tempestades de poeira.

Durante sua missão, ele registra os efeitos devastadores da tempestade de poeira nas vidas das pessoas, mas também descobre a força e a resiliência dos habitantes locais, que enfrentam essas adversidades com coragem e esperança. O conflito interno de John cresce à medida que ele se questiona sobre o impacto de seu trabalho: se suas fotos estão ajudando essas pessoas ou apenas explorando sua miséria para sensibilizar a opinião pública.

A Grande Depressão foi um período de grave crise econômica mundial que começou em 1929 e durou cerca de uma década. Tudo começou com a quebra da bolsa de valores de Nova York, onde os preços das ações despencaram, fazendo com que muitas empresas quebrassem e milhões de pessoas perdessem seus empregos e economias. Esse evento não só abalou os Estados Unidos, mas também teve um efeito dominó em várias partes do mundo, levando a uma grande recessão econômica.

Durante esse tempo, a falta de trabalho e dinheiro foi generalizada, resultando em pobreza e fome para muitas famílias. Os bancos faliram, os negócios fecharam, e as taxas de desemprego dispararam. As pessoas tiveram que enfrentar condições de vida extremamente difíceis, e muitos tiveram que deixar suas casas em busca de trabalho ou ajuda. A Grande Depressão foi um período de grande adversidade e desafio, que eventualmente levou a mudanças significativas na política e na economia, como a implementação de políticas de bem-estar e medidas de estímulo econômico para evitar que tal crise se repetisse.

Não bastasse isso, em 1930, aconteceu o Dust Bowl, uma catástrofe ambiental que ocorreu principalmente na região central dos Estados Unidos, incluindo partes do Texas, Oklahoma, Kansas, Colorado e Novo México, ganhando o nome de “No Man’s Land”, ou seja, uma terra sem dono e que ninguém desejava. Este evento foi caracterizado por tempestades de poeira extremamente severas que destruíram a terra, arruinando as colheitas e fazendo com que muitas fazendas se tornassem inabitáveis. A situação foi causada por uma combinação de seca prolongada e práticas agrícolas inadequadas que não preservaram a integridade do solo, levando à erosão e à incapacidade da terra de reter umidade.

As consequências do Dust Bowl foram devastadoras para os agricultores e habitantes da região. Muitos perderam suas propriedades e meios de subsistência, forçando-os a migrar em busca de trabalho e melhores condições de vida, muitas vezes rumo a estados como Califórnia. Essas migrações em massa exacerbaram os problemas econômicos e sociais já presentes devido à Grande Depressão. O Dust Bowl é um exemplo marcante de como a interação entre atividades humanas e fenômenos naturais pode levar a desastres ambientais de grande escala, destacando a importância do manejo sustentável da terra e dos recursos naturais.

O governo dos Estados Unidos, através da Farm Security Administration (FSA), iniciou um projeto de fotografia com o objetivo de documentar e trazer à atenção do público as condições de vida difíceis nas áreas rurais afetadas pela Grande Depressão e pelo Dust Bowl. As fotografias tinham como meta mostrar a extrema pobreza, as adversidades e os impactos ambientais que os agricultores e comunidades rurais estavam enfrentando. O principal propósito desse esforço fotográfico era gerar empatia e apoiar a implementação de políticas do New Deal, um conjunto de programas econômicos e sociais implementados pelo presidente Franklin D. Roosevelt para recuperar a economia americana.

Entretanto, surgiram acusações que apontavam que algumas dessas fotografias foram encenadas ou manipuladas para produzir um impacto emocional mais forte ou para servir a uma agenda política específica. Críticos argumentavam que ao encenar ou manipular cenas, os fotógrafos poderiam ter distorcido a realidade, priorizando a criação de uma narrativa poderosa que apoiava os objetivos do New Deal, em vez de documentar objetivamente as condições de vida. Essa prática de encenação levantou questões sobre a autenticidade e a ética no fotojornalismo, já que as fotografias eram usadas não apenas como registros históricos, mas também como instrumentos de persuasão e mobilização política.

Embora a maioria dos fotógrafos da FSA se esforçasse para capturar a realidade da vida das pessoas afetadas pela Grande Depressão e pelo Dust Bowl de maneira honesta e direta, as controvérsias em torno da encenação de algumas fotos destacam as tensões entre arte, propaganda e jornalismo, e o impacto que a intencionalidade do fotógrafo pode ter na percepção pública da realidade.

John Clark, protagonista de DIAS DE AREIA, vive uma jornada emocional intensa e complexa, marcada pela relação turbulenta com seu pai, um fotógrafo famoso e abusivo. O legado e os traumas deixados por seu pai impõem um peso grande sobre John, influenciando suas escolhas e a maneira como vê sua própria carreira. Quando ele aceita a tarefa de documentar os efeitos do Dust Bowl nos Estados Unidos, John não está apenas assumindo um compromisso profissional; ele está em busca de seu próprio lugar no mundo da fotografia, tentando se libertar da influência e expectativas paternas.

Enquanto trabalha no Dust Bowl, John se depara com a dura realidade do sofrimento humano e da destruição ambiental. Essas vivências o levam a uma profunda reflexão sobre o verdadeiro propósito de seu trabalho. Ele começa a se questionar sobre o significado de ser fotógrafo e se suas fotos podem, de fato, contribuir de maneira significativa para mudar algo ou ajudar as pessoas. Diferentemente da abordagem que percebe nas obras de seu pai, que lhe parecem distantes e desconectadas da realidade dos retratados, John busca uma conexão genuína e profunda através de suas imagens. Esse conflito interno e sua busca por autenticidade e propósito são essenciais para entendermos a evolução de John Clark na história.

Enquanto John tenta superar os traumas deixados por seu pai e busca entender o verdadeiro significado de seu trabalho, ele descobre o valor das relações humanas, assim como o impacto profundo da perda, que vai além do material e toca a essência da existência. Ele aprende sobre os sacrifícios necessários, sobre o que significa abandonar algo e a importância de ser generoso, colocando às vezes as necessidades dos outros acima das suas. John chega ao Dust Bowl procurando por autoconfiança e profissionalismo, mas ao fim de sua jornada, ele se transforma. Ele encontra um novo sentido para a vida e trilha um novo caminho para seu futuro.

DIAS DE AREIA não traz um enredo piegas ou manipulativo, como algumas das fotos criticadas da época, mas apresenta páginas e mais páginas, todas com poucos diálogos, imagens de solidão, desespero, abandono, destruição, sem reforçar os detalhes, com simplicidade, de maneira direta, objetiva, deixando para o leitor interpretar o que vê e formar uma ideia assustadora do que essas pessoas vivenciaram. E ainda mais forte, algumas páginas são preenchidas com fotos reais da época, criando um paralelo com os desenhos, e deixando o leitor perceber que nenhum dos desenhos consegue se aproximar da crueldade da realidade.

A arte de DIAS DE AREIA traz um estilo artístico que se destaca por sua capacidade de evocar emoção através da simplicidade. As linhas são desenhadas com uma elegância que captura a essência do momento, mesclando detalhes realistas com uma certa suavidade que beira o etéreo, proporcionando uma sensação de imersão na cena. A paleta de cores, dominada por tons pastéis e lavados, contribui para a atmosfera de melancolia e reflexão, como se cada cena fosse tingida pela poeira e pelo desgaste do tempo.

Há uma beleza triste nas tonalidades suaves, criando um cenário quase onírico que contrasta fortemente com a dureza dos eventos retratados. Essa escolha cromática não só define o clima das cenas, mas também ressalta a sensação de isolamento e abandono. A arte tem um poder sutil de transportar o leitor para a realidade sombria da época, usando a cor para contar uma história que vai além das palavras e dos próprios desenhos.

DIAS DE AREIA é uma obra que ressoa profundamente, oferecendo uma janela para um período da história marcado por adversidades e resiliência humana. O romance não somente nos leva a uma viagem visual pela estética da tristeza e da luta, mas também nos convida a refletir sobre as marcas que a natureza e as escolhas humanas deixam na sociedade. Através de seu traço sensível e cores que falam ao coração, a história nos lembra da importância de recordar o passado, aprender com ele e reconhecer a força que emerge quando as pessoas enfrentam e superam momentos de crise. Ao retratar a realidade de maneira crua, mas poética, DIAS DE AREIA se torna uma homenagem àqueles que viveram o Dust Bowl e um lembrete silencioso da nossa responsabilidade coletiva em proteger e valorizar o mundo e uns aos outros.


AVALIAÇÃO:


AUTOR: Aimée de Jongh
ILUSTRAÇÕES: Aimée de Jongh
TRADUÇÃO: Fernando Scheibe e Bruno Ferreira Castro
EDITORA: Nemo
PUBLICAÇÃO: 2022
PÁGINAS: 288
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