CARMILLA é uma história de vampiros e indiscutivelmente a melhor da língua inglesa. É bem mais curta do que muitos romances do gênero e não se preocupa com as aparências clichês do vampirismo – as presas afiadas, o sangue. O terror da história está em seu suspense, a contenção e o medo, mas ainda conta com todos os elementos tradicionais familiares: o castelo solitário na Estíria a donzela inocente como vítima, os pesadelos com o sobrenatural e a dualidade do bem contra o mal.

Publicada pela primeira vez em 1872, na revista Dark Blue, no formato de folhetim, é considerada ao lado da obra de Polidori como uma das primeiras escritas sobre vampiros. Mas o pioneirismo não acaba por aí, é a primeira a ser protagonizada por uma vampira, apresentando, além da atmosfera gótica, um erotismo que marcou época e inspirou Bram Stoker a escrever Drácula.

Laura é uma jovem solitária que vive com o pai em um castelo isolado. Como companhia, além do pai, tem apenas os empregados e, eventualmente, uma visita ou outra de algum parente ou amigo. Por isso ela está ansiosa com a aproximação da data em que um amigo do pai irá visitá-los. Isso irá quebrar a monotonia e o silêncio do castelo. Infelizmente, poucos dias antes disso acontecer, o pai de Laura recebe uma carta onde o amigo informa que perdeu a filha e que terá que atrasar a visita. As condições da perda não são contadas, o homem apenas escreve que precisa ter uma conversa séria pessoalmente onde irá revelar os detalhes da fatalidade.

Entretanto, a rotina do castelo é interrompida com a passagem de uma carruagem acompanhada por estranhos homens. A roda da carruagem bate em uma pedra e, devido à alta velocidade, ela tomba. As duas ocupantes, uma senhora de mais idade e uma jovem da mesma idade de Laura, são socorridas. Quando a carruagem é consertada, a senhora pede ao pai de Laura se a filha pode ficar no castelo, uma vez que ela se sente afetada pelo acidente, até que a senhora vá à cidade a alguns quilômetros de distância para tratar de um assunto urgente. O pai de Laura concorda prontamente. A jovem será uma boa distração e companhia para Laura. O nome da jovem é Carmilla.

CARMILLA cria algumas das características dos vampiros que foram usadas em dezenas de outras obras e que perduram até hoje. As principais são a dissimulação, o erotismo, a necessidade do sangue, a capacidade de se transportar de um local a outro em grande velocidade, a aversão ao sagrado, a sensibilidade à luz solar, o sono diurno em um caixão com terra de cemitério, a decapitação e a estaca de madeira como armas mortais.

Carmilla logo se torna a pessoa mais presente na vida de Laura. A forma como a vampira se aproxima de jovem, sempre com frases e comportamentos que a seduzem em todos os níveis, até ao ponto que ela não consegue discernir o que é real e o que é fantasia, se torna fascinante de acompanhar. Tudo é feito de maneira muito sutil, transparecendo uma ingenuidade e uma inocência que se provam contrárias com o tempo. Em paralelo à chegada de Carmilla, na vila, jovens garotas começam a morrer de uma estranha doença, os médicos não conseguem explicar.

Como são poucas páginas, não há espaço para longas descrições ou capítulos que não avançam na trama. Tudo em CARMILLA é ágil, sem enrolação. É óbvio para o leitor compreender que a tal doença que vai levando aos poucos a vida das jovens, na verdade é a incursão noturna da vampira para sugar o sangue de cada uma delas. Inclusive de Laura. A maior expectativa é descobrir quando e como a vampira será descoberta. A destreza que a autora tem para conseguir criar essa tensão, é magnífica.

CARMILLA, sem dúvidas, é um dos melhores livros de vampiros já escritos. Se considerarmos a época em que foi publicado, com duas personagens principais femininas e o nível de sedução entre elas, o livro se torna ainda melhor e mais importante. É uma leitura rápida e deliciosa. Existem várias edições disponíveis para compra, penso que são todas bem próximas em termos de tradução. A que eu li, tem o adendo de possuir uma segunda história, O VAMPIRO, que não achei nem de longe tão boa quanto CARMILLA, mas vale a leitura assim mesmo. Também há várias páginas de contextualização de cada uma das obras, o que enriquece ainda mais a edição. Se puder, compre e leia.


AVALIAÇÃO:


AUTORES: Le Fanu J. Sheridan e John Polidori
TRADUÇÃO: Giovana Matoso e Regina Nowaski
EDITORA: Pandorga
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 176