Essa resenha vai ser diferente de qualquer outra resenha que fiz.  ENTÃO VOCÊ QUER CONVERSAR SOBRE RAÇA não é um romance, não é ficção, é um fato, e está ocorrendo agora mesmo. Então, enquanto estava lendo, fui anotando diversos tópicos para não falar sem propriedade do assunto, não quero ofender ninguém com esta resenha, mas é necessário falar sobre o assunto.

Ijeoma, a autora, cita em seu livro situações pela qual passou, e diversos amigos seus também passaram, apenas pela sua cor, pela sua ancestralidade estar exibida na sua pele, nos seus lábios, no seu cabelo. Para começar com os tópicos que separei, vou deixar aqui claro, essa resenha vem de uma mulher branca, eu nunca vou saber o tipo de situação pela qual uma pessoa de cor passa, mas tenho plena consciência de que elas acontecem, e quero que isso mude.

Primeiro, o racismo é tratado como segundo tema, em qualquer local que você for discutir, vão querer desviar desse tema, fingindo que o racismo não existe, ou que racistas não existem, ou que a luta das pessoas de cor é infundada. Discussões políticas tendem a privilegiar os brancos das classes mais baixas, escondendo a opressão aos negros, mantendo-os nessas mesmas classes há séculos.

As conversas sobre o racismo são dolorosas, mas são necessárias, devemos matar esse monstro e não nos manter calados diante dessas situações. Mas deixo aqui um fato que você deve sempre respeitar, a pessoa de cor passa por diversas situações de racismo e micro agressões, devemos sempre respeitá-la e nunca forçá-la a conversar conosco a não ser que ela queira. Essa pessoa tem todo o direito de reservar a si mesma a vontade ou não de falar sobre o assunto. Então deixe que ela decida se quer ou não.

Outro fato que a autora constou em seu livro, foram pessoas de cor sofrem desde sua infância. Sim, crianças são tratadas como marginais apenas por sua cor, você pode não estar ciente disso, mas ocorre. Professores tendem a suspender crianças de cor por “mau comportamento”, elas são realmente tratadas como marginais, enquanto as crianças brancas que fazem o mesmo, são tratadas de forma diferente, sendo suspensos apenas por situações mais graves. Isso sem contar que as brincadeiras deles são consideradas “violentas demais”. Lembram do João Pedro, menino de 14 anos morto a tiros dentro da própria casa? Um menino, vítima do racismo da polícia.

Falando em polícia, vamos citar aqui um fato MUITO importante, que eu mesma jamais tinha feito a conexão. Na época da escravidão, existiam os patrulheiros que capturavam os escravos que fugiam para devolve-los aos seus “donos”. Quando a escravidão foi abolida, esses patrulheiros se tornaram policiais, portanto, a polícia que deveria defender a população, defendia a população BRANCA, marginalizando novamente os negros. Você já percebe aqui, há quantos séculos já vem existindo esse racismo estrutural DENTRO da polícia.

O policial, quando envolvido na morte de um jovem negro, enfrentará muito poucas consequências, caso existam. George Floyd foi um estopim no mundo todo, fizeram do policial que o assassinou um exemplo de que não podemos deixar negros serem mortos cada vez mais em silêncio, mas vamos pensar, não existem diariamente mais mortes de negros que não são reportadas? 71% dos homicídios no Brasil são de vítimas negras.

O racismo é estrutural, enraizado na sociedade, cabe a nós combatê-lo, falar sobre ele, buscar conhecer as dores do outro e destruir esse mal, respeitando sempre o espaço daquele que mais sofre, não invadindo, não intimidando, e mesmo que não soubermos onde erramos, e a pessoa se sentir atingida, devemos pedir desculpas e não tentar justificar, até porque nada justifica e não justificará as ações durante séculos de dor e sofrimento do outro.

E vocês sabiam que o Black Lives Matter foi criado por mulheres? Porque eu não sabia. As opressões sofridas por homens negros não incluem opressões por mulheres, mulheres negras são tratadas como pessoas sem voz, e mesmo dentro das classes negras, existe o machismo estrutural. A própria autora sofreu ataques após uma discussão sobre um musico negro famoso estar sendo vangloriado, mesmo tendo diversas acusações sobre o abuso e a violência que ele cometeu contra mulheres negras.

Não sou capaz de anular minha condição de mulher negra para ficar ao lado de homens negros que atacam mulheres negras

Eu sei que essa resenha está ficando enorme, mas tudo que eu estou dizendo a vocês foi o que li nesse livro, eu preciso compartilhar com vocês tudo isso, é um assunto que precisa ser exposto, que precisa ser dito, e temos que dizer com todas as letras.

Agora vem o “por que os negros precisam tanto ser agressivos em suas lutas?”. Sinceramente, se vocês sofressem todos os dias o preconceito que uma pessoa negra sofre, acredito que também seria “agressivo”, eles tem todo o direito de gritar para o mundo que estão sendo mortos, baleados, tratados como lixo perante o homem branco hetero cis, então não venha deslegitimar sua luta. Pessoas de cor, gritem! Vocês são pessoas que tem direito ao reconhecimento, não se calem, não se deixem ser diminuídos, vocês são parte dessa sociedade. Precisamos trazer soluções para o racismo estrutural, chega de falar, falar e não fazer, você não é negro? Isso não te impede de lutar por essa causa.

Gostaria de deixar aqui duas frases desse livro que são importantes:

– A apropriação cultural é o produto de uma sociedade que prefere sua cultura envolta de branquitude. É o produto de uma sociedade que só respeita a cultura envolta de branquitude. E como não vivemos em uma sociedade que respeita igualmente todas as culturas, as pessoas de culturas marginalizadas ainda são constantemente discriminadas pelas mesmas práticas culturais que as culturas brancas são recompensadas por adotar e adaptar em benefício das pessoas brancas.

– Micro agressões ajudam a manter o sistema da supremacia branca unido, porque se não tivéssemos todas essas pequenas maneiras de separar e desumanizar as pessoas, teríamos empatia por elas mais completamente e, então, teríamos que realmente nos preocupar com o sistema que as está destruindo.

Quero que vocês pensem e reflitam sobre tudo que eu disse, e vejam seus privilégios como pessoas brancas, pensem em situações que acontecem diariamente com pessoas de cor, pensem em como seria você ser diminuído apenas por sua cor, e todo dia sofrem uma agressão igual no dia anterior, e mesmo assim, ser taxado de violento quando se rebela contra isso. Pensem no que podemos, e devemos fazer, pensem na luta que devemos ter contra esse mal que corrói nossa sociedade. Espero que vocês leiam esse livro, vejam a profundidade sobre o assunto, que vocês conheçam essa autora, essa luta que deve ser de todos nós. Temos que conversar sobre raça.


AUTORA: Ijeoma OLUO
TRADUÇÃO: Nina RIZZI
EDITORA: Best Seller
PUBLICAÇÃO: 2020
PÁGINAS: 318


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