Tudo estava indo bem na casa de Miv até que, de repente, sua mãe parou de falar. Então, a tia Jean foi morar com eles, Margaret Thatcher foi eleita primeira-ministra, e um predador começou a aterrorizar a cidade atacando mulheres. Agora, o pai de Miv está pensando em se mudar de Yorkshire, e ela não quer nem imaginar isso.

Mas a polícia não consegue avançar nas investigações, então Miv decide que é hora de tentar resolver o mistério sozinha. Embora tenha apenas onze anos, com a ajuda da amiga Sharon, Miv se sente confiante de que pode encontrar as respostas que procura.
Elas começam uma lista de tudo o que acham suspeito na vizinhança e começam a investigar as pessoas do dia a dia, como o dono do mercadinho da esquina, que não é da região; a bibliotecária, que tem variações de humor e aparece com hematomas suspeitos; o vizinho esquisito que sempre usa macacão e gorro e não tem amigos; o “tio” da igreja com um comportamento estranho; e até o próprio pai de Miv.

Caminhando pelas ruas de Yorkshire, Miv e Sharon descobrem segredos maiores do que poderiam imaginar e se deparam com racismo, bullying e violência doméstica – mas também com o poder e a beleza das conexões humanas.

Peter Sutcliffe, conhecido como Yorkshire Ripper, foi um assassino em série que realmente existiu. Entre 1975 e 1980, ele cometeu assassinatos brutais no norte da Inglaterra. Sutcliffe matou 13 mulheres e tentou matar outras 7. Suas vítimas eram geralmente mulheres jovens, muitas das quais eram prostitutas, embora nem todas fossem. Ele usava um martelo e uma faca, frequentemente golpeando as vítimas na cabeça antes de esfaqueá-las.

A década de 1970 foi uma época difícil no Reino Unido, com uma grave crise social e econômica. Havia alta inflação, desemprego crescente e muitas greves industriais. Durante esse período, os trabalhadores faziam greves por causa dos baixos salários e das más condições de trabalho, o que resultava em grandes interrupções nos serviços públicos e na coleta de lixo. O governo do Partido Trabalhista, liderado por James Callaghan, estava desgastado e parecia incapaz de resolver esses problemas, o que aumentava a sensação de caos e insatisfação entre a população.

Margaret Thatcher, líder do Partido Conservador, fez uma campanha eleitoral focada na necessidade de reformas econômicas profundas. Ela prometeu reduzir o poder dos sindicatos, controlar a inflação e restaurar a ordem. Thatcher adotou uma postura firme contra o socialismo e promoveu uma agenda de livre mercado, defendendo a redução dos impostos e do gasto público. Nas eleições gerais de maio de 1979, o Partido Conservador teve uma vitória decisiva, e Thatcher se tornou a primeira mulher a ocupar o cargo de primeira-ministra do Reino Unido.

Durante seu mandato, Thatcher implementou políticas econômicas conhecidas como “Thatcherismo”. Essas políticas incluíam a privatização de empresas estatais, a desregulamentação do mercado e a redução do poder dos sindicatos. No entanto, essas políticas também aumentaram o desemprego e aprofundaram a desigualdade social. A desindustrialização e o fechamento de minas e fábricas em várias regiões do Reino Unido causaram grande descontentamento em comunidades que dependiam dessas indústrias.

Dentro desse cenário, os crimes de Sutcliffe trouxeram ainda mais medo e pânico para a população, especialmente nas áreas de West Yorkshire e Manchester. Thatcher prometeu ser dura com o crime e focou sua administração em fortalecer as forças de segurança e a aplicação da lei. Embora suas políticas não fossem uma resposta direta aos crimes do Yorkshire Ripper, o clima de medo e a demanda por segurança influenciaram a aceitação do público às suas promessas de ordem e disciplina.

A investigação dos crimes de Sutcliffe foi uma das mais longas e caras da história da polícia britânica. A polícia foi criticada por falhas e lapsos, como desconsiderar depoimentos de testemunhas e a falta de coordenação entre diferentes forças policiais. A captura de Sutcliffe, que ocorreu pouco depois de Thatcher assumir o cargo, destacou falhas significativas nos métodos de investigação da época, o que aumentou a pressão por reformas no sistema de justiça e policiamento.

Sutcliffe justificou seus crimes dizendo que estava em uma “missão divina” para matar prostitutas, embora algumas de suas vítimas não fossem envolvidas na prostituição. Ele foi finalmente capturado em janeiro de 1981, quando dois policiais o pararam em Sheffield e descobriram que ele estava usando placas de carro falsas. Durante o interrogatório, Sutcliffe confessou ser o Yorkshire Ripper. Foi condenado por assassinato e sentenciado a 20 prisões perpétuas. Durante o julgamento, Sutcliffe alegou insanidade, mas os jurados rejeitaram essa defesa.

Sutcliffe passou a maior parte de sua vida na prisão sob vigilância rigorosa devido à sua notoriedade e ao risco de ataques por outros prisioneiros. Ele foi diagnosticado com esquizofrenia paranoide e passou vários anos em um hospital psiquiátrico antes de ser transferido de volta para a prisão. Sutcliffe morreu em 13 de novembro de 2020, aos 74 anos, no Hospital Universitário de North Durham. Ele havia testado positivo para COVID-19, mas recusou tratamento, e também sofria de outras condições de saúde.

Nesse contexto, Miv e Sharon começam a investigação sobre o assassino. O que inicialmente é uma tentativa de não se mudar e manter Miv perto de Sharon, aos poucos se torna um aprendizado sobre amadurecimento, amizade, compaixão e solidariedade. Elas também descobrem que nenhuma família é perfeita e sempre tem algum segredo do passado que prefere ficar escondido. Durante a busca, as duas crianças encontram muito mais do que apenas um culpado.

Os capítulos alternam entre as conversas que Miv e Sharon têm com seus suspeitos e eventos da vida de Miv e sua família. No início, o leitor espera que essas conversas reúnam pistas que levem ao assassino e que as meninas encontrem algo que ajude a capturá-lo. Mas, conforme a leitura avança, o leitor percebe que o verdadeiro foco está no aprendizado das duas sobre como a vida das pessoas pode ser difícil. Elas descobrem que não é bom formar opiniões e julgamentos sobre os outros com base em suposições ou preconceitos, pois todos têm diversas camadas que não vemos à primeira vista e cada um tem uma história e um passado que os tornam seres complexos, cheios de esperanças e traumas.

Durante a investigação, Miv e Sharon também encontram pessoas com problemas psicológicos e presenciam injustiças sociais e crimes, como depressão, racismo, xenofobia, bullying, intolerância religiosa, violência doméstica e abuso sexual. Em um bairro onde muitos enfrentam sérias dificuldades e outros cometem ações impensáveis, as meninas amadurecem rapidamente. Elas compreendem a dura verdade de que toda ação gera uma reação e que há consequências para tudo o que fazemos, independentemente de nossas intenções.

A LISTA DE COISAS SUSPEITAS” apresenta um drama tocante narrado por uma criança de onze anos. Algumas descrições e diálogos têm um duplo sentido, o ingênuo e o verdadeiro, devido à perspectiva infantil. Dois terços da história focam nas relações e nas consequências, boas e ruins, que delas surgem. No entanto, na parte final, parece que a escritora se apressou na conclusão, deixando várias questões sem resposta e outras tratadas de forma superficial e insatisfatória. O que mais me incomodou foi a adição de consequências excessivamente dramáticas e desnecessárias, que parecem ter sido criadas apenas para causar impacto e fazer o leitor chorar, não soando orgânico.

Apesar desse gosto amargo e desnecessário que fica após a leitura, “A LISTA DE COISAS SUSPEITAS” é um livro que merece estar na sua estante. Miv e Sharon são personagens cativantes que, ao longo da história, nos ensinam que a vida é movida por decisões e consequências. Não podemos prever se essas ações resultarão em boas ou más consequências, o que destaca a importância da responsabilidade pelo que dizemos e fazemos.


AVALIAÇÃO:


AUTORA: Jennie Godfrey
TRADUÇÃO: Alexandre Boide
EDITORA: Paralela
PUBLICAÇÃO: 2024
PÁGINAS: 352
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