Lona Rosa de Aço quer entrar na luta livre profissional, mas ela vive sob a sombra da mãe, a melhor lutadora do mundo. Tudo muda quando um necromante obcecado por luta livre convida a jovem para participar do maior e mais perigoso torneio do universo e de todos os tempos! O prêmio: seu maior desejo!

A luta livre, também conhecida como wrestling, é um tipo de espetáculo que mistura movimentos atléticos com atuação dramática. Ela tem raízes antigas, vindo de competições de luta de culturas antigas, como gregos e romanos. Na Grécia Antiga, por exemplo, as Olimpíadas tinham lutas parecidas com a luta livre de hoje. Mas a luta livre moderna começou mais no século 19, quando virou um esporte de exibição e entretenimento.

Nos Estados Unidos, a luta livre ficou famosa no final do século 19 e começo do século 20 como uma forma de entretenimento. Ela era mostrada em circos e depois em lugares só para luta. Nessa época, tinha muito teatro e personagens exagerados, com lutas ensaiadas e histórias criadas para atrair o público.

Nos anos 1980, a luta livre nos EUA ficou super popular, especialmente com a World Wrestling Federation (WWF), que depois virou a World Wrestling Entertainment (WWE). Nessa época, a luta virou um fenômeno mundial, com eventos grandes como o WrestleMania e lutadores que pareciam super-heróis ou vilões em histórias complicadas. Hoje, a luta livre nos EUA continua sendo espetacular, misturando esportes, teatro e histórias que atraem milhões de fãs em todo o mundo.

No Brasil, a luta livre é mais conhecida como telecatch, uma versão do wrestling. Ela foi muito influenciada por lutadores de fora, como Ted Boy Marino da Itália, que ficou famoso no país. O telecatch brasileiro era mais teatral e engraçado, passando na TV Tupi e na TV Excelsior. Esses programas ajudaram a popularizar o esporte, com personagens coloridos e histórias exageradas que atraíam muita gente.

Quando eu era criança, eu realmente achava que as lutas eram de verdade e que quem ganhava dependia só do que os lutadores faziam, das suas habilidades, ou de como os vilões podiam usar truques para ganhar mesmo se estivessem perdendo. Mas conforme eu fui crescendo, percebi que os golpes eram exagerados, feitos para parecerem reais, mas que eram combinados antes da luta começar. Isso era feito de propósito para fazer parte de uma história maior, onde nem sempre o lutador que gostávamos era o personagem principal.

Mesmo assim, continuei gostando de assistir, mas passei a ver as lutas como um show planejado, com um desfecho que às vezes surpreendia ou tinha reviravoltas, parecido com novelas. E por isso, a emoção de ver como tudo se desenrolava continuou, já que o resultado, mesmo não dependendo das habilidades dos lutadores, ainda era uma surpresa. Acho que essa expectativa de torcer pelo nosso personagem favorito é o que mantém a luta livre interessante, especialmente nos EUA e no México, independente do que é real ou não.

POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” realmente não esconde o drama das lutas livres; na verdade, destaca como tudo é cuidadosamente ensaiado para criar o espetáculo. Porém, como em qualquer show que envolve acrobacias, há sempre o risco de algo dar errado e alguém se ferir. Nas lutas livres, acidentes não são raros, principalmente porque os movimentos são feitos sem pausas para concentração, tentando manter tudo o mais realista possível. Assim, qualquer erro pode causar ferimentos sérios, como fraturas na coluna ou no pescoço, o que pode ser muito grave.

Na história, Yua Rosa de Aço tem como principal adversário o lutador conhecido como Serpente do Sol. Durante uma luta, Serpente tenta executar um golpe arriscado de cima das cordas do ringue, mas acidentalmente escorrega. Ele solta Yua de forma prematura e incorreta, fazendo com que ela caia e quebre o pescoço, o que a leva à morte no hospital mais tarde. Jacob, seu marido, junto com a pequena Lona, sua filha, ficam devastados com a perda.

Conforme os anos passam, Lona cresce e decide seguir os passos de sua mãe no mundo da luta livre, mesmo com seu pai, Jacob, sendo contra. Ele, ainda abalado pela tragédia que levou sua esposa, teme que a filha sofra algum acidente semelhante. Esse medo de Jacob provoca muitos desentendimentos entre eles, deixando a relação tensa e carregada de tristeza.

Em uma noite particularmente difícil, depois de Lona perder uma luta e ter uma briga intensa com o pai, um homem misterioso chamado William Necroton se aproxima dela. Ele a convida para participar de um torneio muito diferente: uma competição de luta livre em um mundo alternativo onde ele é um necromante, um mago que tem poder sobre os mortos. As lutas serão em dupla e o prêmio final para os campeões é a realização de um desejo, que pode ser até mesmo a volta da mãe de Luna.

No entanto, neste mundo controlado pelo necromante, as lutas são completamente diferentes. Lá, elas não são ensaiadas ou coreografadas; são verdadeiras batalhas onde os golpes são reais e podem causar ferimentos graves ou até mesmo serem fatais. Lona está decidida a participar, mas enfrenta um problema: ela precisa de um parceiro.

O necromante então sugere algo surpreendente: que ela convide Serpente do Sol, o lutador responsável pelo acidente de sua mãe. Serpente do Sol nunca se perdoou pelo que aconteceu e desde então se submete a lutas em circuitos marginais, onde busca a derrota como forma de punição pessoal. Movido pelo remorso e pela chance de redenção, ele aceita a proposta de Lona.

Juntos, eles fazem um pacto: vencer o torneio para ganhar a chance, oferecida pelo necromante, de trazer Yua de volta à vida. Com esse objetivo comum, Lona e Serpente do Sol preparam-se para enfrentar os desafios mais perigosos que já encararam, unindo forças numa busca que é tanto por vitória quanto por perdão.

É fácil entender por que “POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” foi premiado com o Prêmio Eisner como o melhor quadrinho para adolescentes. A começar pela arte, que é cheia de detalhes e tem um estilo vibrante e cheio de energia. As linhas são nítidas e as cores são vivas e fortes, o que ajuda a passar a intensidade das cenas de ação. Os personagens têm rostos muito expressivos que mostram emoções fortes como surpresa, esforço e determinação, e isso deixa a história mais dramática e cativante. Além disso, o uso de ângulos dinâmicos e perspectivas inovadoras, como olhares de cima para alguns golpes, intensifica a sensação de movimento e o impacto visual das lutas.

A paleta de cores é vibrante e cheia de contrastes, o que destaca os trajes dos personagens e o ambiente ao redor. Cores como vermelho, laranja e azul são predominantes, realçando a energia e o calor das batalhas. O uso de sombras e uma iluminação dramática intensifica a tensão das cenas, especialmente nos momentos de maior impacto e nas poses de vitória dos personagens. Os movimentos são fluidos e bem coreografados, transmitindo uma sensação de peso e força.

As ações dos personagens são exageradas de forma estilizada para ressaltar a intensidade dos combates. Efeitos sonoros visuais como “WHOAAHH” e “CRASH” aparecem nos quadros para simular os sons das lutas, aumentando a imersão do leitor na cena. A narrativa visual é cuidadosamente planejada com sequências de quadros que direcionam o olhar do leitor através da ação, garantindo que cada movimento seja claro e impactante.

O cenário do ringue é rico em detalhes, incluindo a multidão, as luzes e a estrutura do palco, contribuindo para a autenticidade da cena de wrestling. A arte não apenas complementa o texto, mas também ajuda a contar a história por si mesma, através de detalhes visuais e expressões dos personagens, tornando a experiência mais rica e envolvente.

A arte de “POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” por si só já cativa qualquer leitor. É tão bem feita que poderia contar a história inteira sem precisar de uma única palavra. Mas a qualidade do quadrinho vai além quando o autor inclui diálogos ricos em emoção e cheios de significado, junto com reviravoltas surpreendentes no final de cada capítulo. A primeira reviravolta, especialmente, me pegou desprevenido e adicionou muito drama à história.

Lona e Serpente do Sol são dois personagens que se completam por vários motivos. Eles têm muitos objetivos em comum, não só um. Lona é determinada e teimosa, capaz de tomar decisões difíceis e de fazer qualquer sacrifício para trazer sua mãe de volta. Apesar da dor que sente, ela não culpa diretamente o Serpente do Sol. Ela entende que foi um acidente, mesmo que ainda guarde mágoa dele. Serpente do Sol, por sua vez, admite seu erro e não nega sua culpa, mas não sabe como se redimir, ou se isso é sequer possível. O torneio é a chance para ambos e, aos poucos, eles percebem que precisam se unir para vencer.

Não pense que a jornada de Lona e Serpente do Sol é infantil ou superficial. Existe uma profundidade real no sacrifício dos dois personagens e no caminho que eles empreendem para tentar corrigir os erros do passado. O desejo de Lona vai além de querer sua mãe de volta; ela também quer ajudar seu pai a sair da profunda tristeza em que se afundou. Quanto ao Serpente do Sol, ele busca redimir o erro que cometeu e que levou à morte de sua colega, desejando recuperar sua própria paz interior, pois vive atormentado pelo remorso.

A maturidade do enredo de “POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” se mostra clara em cada capítulo por várias razões. Primeiro, a história vai além de Lona e Serpente. Explora também outras duplas que participam do torneio, cada uma com seu próprio passado dramático e desejando algo que parece impossível, como o retorno de entes queridos que perderam. Isso distribui a empatia do leitor não só entre os personagens principais mas também entre os secundários, que são retratados não como vilões, mas como um grupo de pessoas em busca de paz e redenção, todas merecedoras do prêmio final.

O desfecho de “POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” reforça a complexidade e a profundidade do roteiro. O leitor não deve assumir que os protagonistas, por serem os principais, conseguirão o que desejam ou serão os vencedores. O capítulo final transmite claramente que o que mais desejamos pode ser alcançado de maneiras diferentes, que a vida nem sempre oferece segundas chances e que, muitas vezes, é necessário aprender a viver com nossos erros. Precisamos aprender a seguir em frente e a lidar com a dor, contando com as memórias e o apoio das pessoas que amamos.

POWERBOMB! FAÇA UMA SUPERBOMBA” é um quadrinho impactante e emocionante que se destaca tanto pela sua arte quanto pela sua história, oferecendo uma experiência única que é difícil de encontrar. No prefácio, o autor revela seu amor pela luta livre e pela sua filha pequena, o que ecoa o ponto que destaquei no início desta resenha: não importa que as lutas não sejam reais. O que realmente conta é a emoção de assistir aos confrontos, a expectativa pelo desfecho e a torcida pelos personagens que conquistam nosso coração. O quadrinho é uma fusão do amor por uma narrativa envolvente com o amor por uma família. É, sinceramente, algo lindo de se ver.

Por curiosidade, na luta livre, uma powerbomb é um movimento de finalização muito popular e poderoso. O movimento envolve o lutador que executa a manobra levantando o oponente de forma que este fique sentado sobre seus ombros, com as pernas do oponente posicionadas ao redor da cabeça do lutador. Em seguida, o lutador que aplica a powerbomb arremessa o oponente de costas contra a lona do ringue com força, causando um impacto significativo.

Com isso esclarecido, quero tocar num ponto comum aqui no Brasil: muitas vezes, parece que há uma subestimação da capacidade do público em entender um título em inglês, especialmente quando inclui um termo específico. O título original do quadrinho é “FAÇA UMA SUPERBOMBA“. Mesmo que inicialmente o leitor não saiba exatamente o que significa “superbomba”, ele vai entender conforme avança na leitura. Então, surge a pergunta: por que a necessidade de repetir o nome no título em português?


AVALIAÇÃO:


AUTOR: Daniel Warren Johnson
ILUSTRAÇÕES: Daniel Warren Johnson e Mike Spicer (cores)
TRADUÇÃO: Giovana Bomentre
EDITORA: Devir
PUBLICAÇÃO: 2024
PÁGINAS: 192
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