Outono de 1988. As melhores amigas Abby e Gretchen cursam o ensino médio em uma prestigiosa escola católica, mas são meninas populares que idolatram Madonna e odeiam os pais. Quando as duas experimentam alucinógenos, Gretchen decide nadar nua no riacho, mas acaba desaparecendo a noite inteira e volta… estranha. Está carrancuda, irritadiça, cheia de espinhas e cicatrizes e usa sempre as mesmas roupas largas e feias. Não demora muito para eventos bizarros e sangrentos começarem a acontecer por onde ela passa.

Preocupada com a amiga, Abby decide investigar o que aconteceu naquela noite. Suas descobertas são aterrorizantes, e tudo indica que Abby não vai escapar ilesa se não se afastar de Gretchen. Agora, o destino das duas depende de uma única pergunta: a amizade delas é forte o bastante para derrotar o diabo?

Penso que há dois tipos de terror e ambos evocam medo de forma diferente: o primeiro é aquele terror fantástico, mais fantasioso, com elementos que usam o impossível físico para provocar quem lê ou assiste. Por exemplo, posso citar O EXORCISTA, com a personagem virando a cabeça em 180 graus, contorcendo a espinha, soltando fluídos em uma quantidade excessiva, tudo fisicamente e biologicamente impossível, mas crível dentro daquilo que a obra propõe. Outros exemplos poderiam ser OS CAÇA-FANTASMAS e POLTERGEIST. Esse é o tipo de terror que, se bem feito, nutre o objetivo de causar medo, pode exercer o contrário se perder a mão, quando usa efeitos especiais demais. O absurdo fica acima da capacidade do leitor ou do espectador em aceitar.

O segundo tipo é aquele terror psicológico, que usa de insinuações, da possível loucura, como força motora para deixar no leitor a dúvida se o que acontece é real ou fruto da demência dos personagens. Como exemplo, temos O ILUMINADO, LONEY, O BEBE DE ROSEMARY, entre outros. Não existem efeitos especiais, não acontecem eventos com monstros, com demônios aparecendo. O que assusta é o comportamento dos personagens, aquilo que eles realizam com a justificativa de ouvirem vozes, de conversarem com entidades que só eles enxergam, e com isso, perpetuam atos absurdos.

O EXORCISMO DA MINHA MELHOR AMIGA se encaixa entre esses dois tipos. Em mais da metade do livro, o leitor acompanha a deterioração psicológica de Gretchen, cada vez mais dominada por uma entidade que ela afirma estar tomando conta de sua mente e a obrigando a cometer atos cruéis. A última parte da história apresenta algumas situações que ultrapassam o físico, com coisas físicas que seriam impossíveis. O efeito de causar medo, pelo menos para mim, surte efeito de maneira parcial. Apesar de meu psicológico já estar devidamente condicionado pelas partes anteriores, os trechos fantásticos criam um contraste que quebra a imersividade.

Enquanto O EXORCISMO DA MINHA MELHOR AMIGA é relativamente eficaz na área do medo, o mesmo não posso dizer com relação à construção dos personagens secundários. Eles são pouco empáticos, senti enorme dificuldade em me importar com eles. Suas atitudes são egoístas, sádicas em alguns pontos, mesmo com a apresentação de um histórico familiar que poderia justificar esses comportamentos. Realmente não torci por eles. Fiquei indiferente.

Já com Abby e Gretchen aconteceu o inverso. Elas se conheceram em 1982, quando tinham 10 anos de idade. Uma situação de bullying e total indiferença das colegas e professores, culmina com o início da amizade das duas. Seis anos mais tarde, mais amigas ainda, acontece o tal evento na floresta em que Gretchen desaparece. Todo esse trecho é muito eficiente, principalmente quando Abby vai em busca da amiga, encontra uma construção abandonada e tem a visão de algo que é simples e, por essa simplicidade, causa medo.

A insistência das duas em manterem a amizade, principalmente de Abby, uma vez que depois da metade do livro, Gretchen deixa de ser Gretchen, é emocionante e consegue despertar sentimentos fortes no leitor. A emoção é maior no clímax da história, após a solução da trama, quando o tempo avança e acompanhamos a relação das duas de forma rápida por várias décadas. É a parte mais bonita do livro e demonstra como as amizades verdadeiras, construídas sobre adversidades, podem ser eternas, mesmo quando a vida, a rotina, teima em tentar afastar as pessoas.

Apesar de alguns outros problemas que a narrativa de O EXORCISMO DA MINHA MELHOR AMIGA apresenta em relação a preconceitos, racismo, drogas, estupro, eu acho que o resultado é aceitável, se quem ler tiver descernimento para compreender e classificar as informações. É uma história em que o terror é o assunto principal, mas o que se destaca mesmo, é a união de duas garotas por toda uma vida. Muito lindo, leia!


AUTORA: Grady HENDRIX
TRADUÇÃO: Edmundo BARREIROS
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 320


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