Para você ler O DITADOR HONESTO, é preciso realizar, primeiro, uma limpeza na sua mente quanto a ciências políticas ou preferências de direita ou de esquerda. Encare a leitura como aquilo que ela é: uma utopia sobre a governança de um ditador no Brasil. Neste ponto, você pode pensar que a história remete a acontecimentos da época militar dos anos de 1964 a 1985, mas é um ledo engano. A narrativa é quase alegórica, com passagens que chegam a beirar a ingenuidade, o que permite que a imaginação do leitor vague livre por onde quiser.
Como o próprio autor faz questão de ressaltar no prefácio:
…esta produção não possui pretensão alguma, senão a de protestar e emitir uma triste gargalhada em desrespeito à hipocrisia popular e à nauseante política nos tempos em que vivemos. (…) Este livro é um conto de fadas. Não por se tratar de uma fantasia, mas porque em contos de fadas as coisas simplesmente acontecem, assim como na vida.
O livro é narrado em primeira pessoa por Antônio, um personagem que se torna secundário diante da verdadeira estrela da história, Gutemberg, o tal ditador honesto do título. Acompanhamos sua ascensão através de atos que, como o autor disse, apenas são o que são, sem qualquer necessidade de credulidade ou de análise lógica. As coisas vão se sucedendo em uma velocidade vertiginosa, até culminar no total domínio do Brasil por Gutemberg.
Nesse ponto, o ditador chega onde não há mais para onde ir, bem como a população, e igual o rebobinar de uma fita, as coisas começam a andar para trás, e Gutemberg tem um destino tão pragmático quanto sua política. E esse final, por mais absurdo que possa parecer, reflete como é o pensamento da turba, da multidão, e reforça aquela máxima de que a coletividade é burra, ou mesmo inconsequente.
O DITADOR HONESTO é um exercício de imaginação sobre o que poderia e o que não poderia ser o Brasil. O autor, apesar de utilizar e abusar da descrença do leitor, da total liberdade de sua prosa, consegue transmitir o que é essencial para a história: a vontade do pensar sobre como vivemos e como somos governados. E em um ano de eleições, onde um dos principais candidatos é tão esdrúxulo quanto um vilão de quadrinhos, e que consegue convencer uma grande fatia dos eleitores a se comportarem como acéfalos, O DITADOR HONESTO pode trazer aquela coceira do pensar, do raciocínio. Amém!
Seguindo a mesma linha de forçar o cérebro do leitor, PRO INFERNO COM ISSO traz uma sequência de contos dos mais variados tipos que conseguem entreter, surpreender e causar aquela sensação de familiaridade, de algo que você poderia perfeitamente ouvir em uma conversa de bar, do seu vizinho, na escola ou faculdade.
O autor viaja entre o medo, através de um conto sobre uma doença; sobre a vontade de se viver para sempre; sobre a inveja e a vingança entre irmãos; sobre o abuso emotivo, a subserviência pelo amor; as diferentes visões entre pais e filhos; sobre a realidade da amizade, ou da inimizade; ou até mesmo em um conto mais existencialista, introspectivo. São mais de vinte e dois contos curtos, de duas ou três páginas cada um, em um total de pouco mais de cem páginas. Não há lugar para enrolação, tudo é tratado de forma direta, com mensagens diretas, mas nem por isso displicentes.
Outro detalhe que vale destacar em PRO INFERNO COM ISSO, é a confirmação da originalidade e da necessidade do autor fazer o leitor questionar seu próprio estilo de vida, seu comportamento e o seu círculo de convivência. Isso é uma das coisas mais importantes em um livro: causar movimento no leitor.
O DITADOR HONESTO e PRO INFERNO COM ISSO não são, de forma alguma, livros que você fecha e se esquece em seguida. Você será obrigado a pensar sobre o que leu e a forma como o que leu se encaixa dentro de você e na sociedade. Tem coisa melhor?
Agora, um aviso bem legal: se você for na Bienal de São Paulo, Matheus Peleteiro estará no evento nos dias 11 e 12, no stand da Futurama. Por que não passa por lá, conhece o autor, pede um autógrafo, compra um ou dois livros… 😉
E se você, infelizmente, não for, seguem os dados do Matheus para você conhecer um pouco mais sobre ele e como pode conhecer e adiquirir suas obras:
CONTATO: Facebook
LIVRO MUNDO CÃO: Amazon, Saraiva, Cultura
LIVRO NOTAS DE UM MEGALOMANÍACO MINIMALISTA: Cultura, Amazon
AUTOR: Matheus PELETEIRO, nascido em Salvador – BA em 1995, escritor, tradutor, poeta e contista, Matheus Peleteiro publicou em 2015 o seu primeiro romance, Mundo Cão, pela editora Novo Século. Em 2016, lançou a novela intitulada “Notas de um Megalomaníaco Minimalista” (editora Giostri) e o livro de poemas “Tudo Que Arde Em Minha Garganta Sem Voz” (editora Penalux). Em 2017, publicou “Pro Inferno com Isso”, seu primeiro livro de contos. Em 2018, assina, ao lado do tradutor Edivaldo Ferreira, a tradução do livro “A Alma Dança em Seu Berço” (editora Penalux), do poeta dinamarquês Niels Hav.
EDITORA: Independente
PUBLICAÇÃO: 2018 e 2017
PÁGINAS: 171 e 122
AVALIAÇÃO:
Oi Carl!
Parece ser bom, para quem curte o gênero é uma mão cheia…
Infelizmente não gosto do gênero então para mim não seria uma leitura legal…
Bjs!
Livros que te fazem pensar, como são bons.
Não gosto de livros sobre política, não faz parte das coisas que me interessam.
E mais um livro de autor nacional. Estou conhecendo muitos autores nacionais pelo blog, e isso me deixa feliz.
Saber que assim como os estrangeiros, nossos talentos nacionais também estão começando a ficar mais conhecidos…
Olá.
O assunto sobre política não é muito do meu interesse, então este livro não me traz vontade em lê-lo, mas parece ser ótimo para quem gosta do gênero!
Olá! Gostei bastante da proposta do livro e ratifico o Amém para que a história mexa com os leitores e os façam refletir melhor em suas escolhas nessas eleições. Adoro um bom livro de contos, onde posso encontrar histórias mais rápidas, mas com grande intensidade e já quero conferir. Realmente não tem nada melhor quando o livro, mesmo após o final, ainda consegue mexer com você e o mais importante fica com você.
É, não parecem serem aquelas coisas todas, mas parecem nos fazer refletir mais sobre a nossa situação política e no mundo, como pensamos e deixamos de valorizar o poder da escolha certa na hora da votação.
Interessante até.
Abraços.