
Quando peguei “Vampeerz” pra ler, já sabia que ia ser um mangá diferente. Confesso que fiquei dividido entre gostar bastante e me sentir desconfortável em alguns momentos. A história acompanha Ichika, uma adolescente de 14 anos, e Aria, uma vampira centenária, presa em um corpo jovem. As duas começam um relacionamento estranho e sobrenatural, com doses de romance, comédia e aquele clima meio gótico.
Uma coisa que chamou muito minha atenção desde o início foi a qualidade da arte. O traço é lindo mesmo, com Ichika sendo muito fofa e Aria impressionante visualmente, exatamente como a gente imagina uma vampira. O jeito como o desenho consegue passar tanto cenas engraçadas quanto dramáticas também é um ponto forte, que realmente contribui para o clima da história.
O humor é outro ponto alto. Os diálogos espirituosos e as situações absurdas remetem ao charme dos mangás clássicos, criando momentos genuinamente divertidos. Por falar nisso, a narrativa é bem episódica, com capítulos que funcionam quase independentes uns dos outros, mesmo enquanto a história principal vai avançando aos poucos. Isso, sinceramente, me confundiu às vezes. Teve cenas que pareciam meio jogadas, e algumas motivações dos personagens não ficaram claras pra mim. Acho que o mangá poderia explicar melhor certas coisas, porque tem uns momentos que simplesmente não fazem sentido.
A relação central tem seus momentos. O “pânico gay” de Ichika ao conhecer Aria é retratado com autenticidade e humor. Porém, a decisão de Aria se mudar para a casa de Ichika disfarçada de prima dilui o mistério vampiresco, transformando o sobrenatural em doméstico de forma nem sempre eficaz. E criando uma proximidade que torna ainda mais evidentes os problemas da diferença de idade. Na minha opinião, o grande problema do mangá.
Aria tem centenas de anos, enquanto Ichika tem apenas 14. Essa disparidade abissal, mesmo mascarada pela aparência juvenil da vampira, levanta questões éticas fundamentais. O mangá segue um tropo problemático comum em ficções sobrenaturais: o ser imortal “preso” em corpo jovem que se relaciona com adolescentes, uma fantasia que normaliza desequilíbrios de poder tóxicos. Na vida real, relacionamentos com tamanha assimetria de experiência e maturidade seriam inequivocamente prejudiciais, e a romantização dessas dinâmicas em ficção pode distorcer percepções sobre o que constitui um relacionamento saudável.
Essas preocupações se intensificam nas cenas de banho e momentos de nudez parcial, comuns no gênero yuri mas particularmente problemáticas quando envolvem uma personagem de 14 anos. A introdução de Sakuya, uma vampira com comportamento explicitamente predatório em relação a garotas jovens, não apenas amplifica o desconforto como parece normalizar padrões de comportamento.
Penso que “Vampeerz” ocupará um espaço polarizador entre os fãs de histórias vampirescas. Para quem aprecia narrativas sobrenaturais leves, a obra oferece arte deslumbrante e momentos encantadores. Entretanto, é crucial abordar essas histórias com senso crítico, reconhecendo que a fantasia do “imortal em corpo jovem” frequentemente mascara dinâmicas que, despidas do verniz sobrenatural, seriam inaceitáveis.
Aliás, caso você não conheça, “yuri” é um gênero japonês focado em relacionamentos românticos e às vezes sexuais entre mulheres. O termo literalmente significa “lírio” em japonês. As histórias podem ir de romances leves e fofos até conteúdos mais explícitos, abordando coisas como descoberta da sexualidade, aceitação social e familiar, e os desafios específicos enfrentados por casais femininos. É um gênero bem variado que evoluiu bastante com o tempo, oferecendo tanto narrativas inocentes quanto dramas adultos complexos, refletindo a diversidade das experiências LGBTQ+.
AVALIAÇÃO:
AUTOR: Akili ILUSTRAÇÕES: Akili TRADUÇÃO: Cristina Mayumi Maki EDITORA: JBC PUBLICAÇÃO: 2025 PÁGINAS: 168 COMPRE: Amazon |