Primeiro, o uso de novos agrotóxicos sem os devidos testes. Depois, a reação inesperada com as larvas que eles deveriam dizimar. Não se sabe quem foi o primeiro infectado, apenas que o surto começou no Mato Grosso do Sul. São os chamados corpos secos: espectros humanos que não possuem mais atividade cerebral. Mas seus corpos ainda funcionam e anseiam por sangue.

Seis meses após o surto, poucas pessoas conseguiram sobreviver. A história acompanha quatro delas lutando para continuar vivas. Entre elas está Mateus, um rapaz que parece ser imune à doença e está sendo estudado por médicos. Ele precisa ser protegido porque o hospital onde estão se refugiando corre o risco de ser invadido pelos infectados. Estes, por alguma razão, seguem as ordens de um homem misterioso que aparece entre eles e fala coisas sem sentido, sempre dirigidas a Mateus. O jovem e os outros no hospital não sabem quem é esse homem, como ele consegue ficar entre os infectados sem ser atacado ou como ele os controla.

Regina, uma dona de casa, mora com o marido numa fazenda no interior do Brasil. Depois que alguns infectados atacam, ela consegue fugir com as duas filhas do caseiro. As três partem numa jornada em busca de segurança, mas parece que encontrar um lugar seguro é quase impossível. A situação se complica ainda mais quando Regina é resgatada e levada para outra fazenda que parece segura, mas esconde segredos que podem ser ainda mais perigosos que os infectados.

Murilo é um menino que observa a mãe fazer de tudo para proteger a família e evitar o contágio. Ele é irmão de Mateus, e os dois fizeram promessas de se reencontrar. Juntos, Murilo e sua família viajam por uma longa distância até chegarem à casa dos tios, que serve como um breve refúgio antes de tentarem seguir para um local mais seguro. No entanto, encontrar um lugar verdadeiramente seguro é difícil quando a maioria das pessoas está infectada.

Constância e Conrado são irmãos gêmeos que estão procurando um lugar seguro no sul do Brasil. Eles perderam contato com o pai durante um ataque de infectados em um túnel. Desde esse dia, os dois fazem tudo que podem para sobreviver, tentando alcançar um lugar que acreditam ser seguro dos infectados. No meio de sua jornada, eles percebem que terão que tomar decisões difíceis para continuar.

Corpos Secos” é um livro escrito por quatro autores, cada um responsável pela jornada de um personagem principal. Os capítulos alternam entre narrativas em primeira e terceira pessoa. Inicialmente, poderíamos esperar estilos de escrita distintos para cada autor, e de fato há variações, mas são sutis. Apesar dos diferentes narradores, a forma de contar as histórias é bastante similar, ao ponto de, em alguns momentos, parecer que foi o mesmo autor que escreveu todas elas.

Os zumbis de “Corpos Secos” são similares aos de muitas outras histórias do gênero. Eles lembram bastante os infectados do jogo e série “The Last of Us“, onde as pessoas são contaminadas por fungos que surgiram devido ao excesso de químicos nos alimentos. Apesar dessa semelhança, o livro não apresenta variedades de infectados como no jogo ou na série, onde existem diferentes tipos e níveis de perigo. No livro, todos os infectados são mais uniformes. Assim como em “The Last of Us“, um dos personagens do livro é imune e sua segurança é crucial, pois ele pode ser a chave para encontrar uma cura. Quanto à dinâmica da ação, o livro segue o modelo típico do gênero, sem grandes surpresas ou reviravoltas inesperadas para quem já está familiarizado com histórias de zumbis.

Corpos Secos” usa muitos clichês típicos do gênero, o que poderia torná-lo um livro divertido, mas acaba não sendo tão satisfatório porque deixa várias pontas soltas. Por exemplo, nenhuma das quatro histórias principais é concluída de forma completa. Além disso, algumas ideias introduzidas no começo, como a figura misteriosa que parece conhecer Mateus, são abandonadas sem explicações. Também há uma expectativa de que as histórias dos personagens se cruzem de forma significativa, o que acontece com duas delas, mas apenas no final e de uma maneira pouco impactante e até frustrante.

A jornada de Mateus é cheia de ação, incluindo perseguições e tiros, mas as mortes ao longo do caminho não causam muito impacto. Isso acontece porque não há tempo suficiente para o leitor criar laços com os personagens secundários que morrem. A história de Regina é difícil e desafiadora, mas fica complicado sentir empatia por ela, já que frequentemente ela abandona quem está ao seu lado e, em uma situação onde várias crianças estão em perigo, ela pensa apenas em si mesma. Murilo, visto pelos olhos de uma criança, tem uma narrativa menos emocional e acaba sendo apenas uma sequência de fugas de um lugar para outro. Constância e Conrado têm uma jornada mais envolvente, onde os irmãos enfrentam escolhas difíceis, tornando-se a parte que mais gostei, apesar de também não trazer surpresas; o desenrolar dos eventos é previsível.

Corpos Secos” parece mais um livro de contos devido ao seu formato breve e à maneira como as histórias começam e terminam abruptamente. Apesar disso, não acho que seja uma leitura ruim; lembra mais quatro episódios de uma série de zumbis que foi cancelada no meio da temporada. Eu não conhecia o livro até ele ser escolhido para o Clube do Livro do Felipe Neto. Gosto muito de histórias de zumbis, especialmente de autores brasileiros, e fiquei ainda mais interessado ao saber que os autores foram premiados com o Jabuti na categoria “Romance de Entretenimento”. Por causa dessa expectativa, a decepção foi grande. Eu esperava muito mais, especialmente comparando com outras obras do gênero que são muito melhores, sem nem considerar os quadrinhos.


AVALIAÇÃO:


AUTORES: Luisa Geisler, Marcelo Ferroni, Natalia Borges Polesso e Samir Machado de Machado
EDITORA: Alfaguara
PUBLICAÇÃO: 2020
PÁGINAS: 192
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