Você destruiria seu mundo em nome da verdade? A última região habitada do mundo, Untherak, é povoada por humanos, anões e gigantes, sinfos, kaorshs e gnolls. Nela, a deusa Una reina soberana, lembrando a todos a missão maior de suas vidas: servir a Ela sem questionamentos. No entanto, um pequeno grupo de rebeldes, liderado por uma figura misteriosa, está disposto a tudo para tirá-la do trono. Com essa fagulha de esperança, mais indivíduos se unem à causa e mostram a Una que seus dias talvez estejam contados. Um grupo instável e heterogêneo que precisará resolver suas diferenças a fim não só de desvendar os segredos de Untherak, mas também enfrentar seu mais terrível guardião, o General Proghon, e preparar-se para a possibilidade de um futuro totalmente desconhecido. Se uma deusa cai, o que vem depois?

Como quase toda a fantasia publicada nas últimas décadas, ORDEM VERMELHA utiliza de muitos elementos de O SENHOR DOS ANÉIS, alterando de leve alguns conceitos, criando pequenos detalhes diferentes e dando uma roupagem que mistura os personagens tradicionais (anões, elfos, humanos, orcs, ogros, etc.) com personagens de anime e suas armas gigantescas, mágicas e poderosas. Tudo isso, quando bem aplicado, mesmo não sendo original, não é ruim, pelo contrário. E o autor consegue aplicar de forma competente e segura cada uma dessas características. Mas apenas em algumas partes.

A história de ORDEM VERMELHA é cheia de altos e baixos. Existem momentos muito bons, emocionantes, com lutas bem descritas, perseguições que causam ansiedade, confrontos surpreendentes que criam um interesse gigante na continuação da leitura. Mas também existem outros momentos que são muito ruins, com falhas, furos, excesso de descrições, personagens rasos, diálogos sem sentido e atitudes desmedidas e ilógicas. Ou seja, há partes que eu li em minutos, e há partes que eu pensei seriamente em abandonar a leitura.

Todas as páginas em preto e letra branca que precedem as divisões em partes da história e mostram o avanço de um guerreiro portador de uma espada imensa, exatamente como sua habilidade na luta, são muito boas. Principalmente a última, quando é desvendado quem é esse guerreiro.

A história de Raazi e Yanisha, duas kaorsh, uma raça camaleônica, também conquista e conversa com nossos dias atuais por ser uma relação homoafetiva. As duas guerreiras se completam, demonstram e convencem o leitor do amor que uma sente pela outra e causam uma dor de estômago quando temos que acompanhar a luta das duas em uma arena mortal.

Aelian, o jovem falcoeiro que é o personagem principal, consegue conversar com o leitor, consegue criar uma empatia e uma torcida, mesmo ele fazendo coisas absurdamente estúpidas durante a aventura. Inclusive, seu falcão é bem utilizado, aparece nas partes que precisa, sem parecer gratuito, e ocupa o papel de animal de estimação por quem todos torcem para que não seja sacrificado em algum momento.

Temos também o general vilão, Proghon, braço direito de Una, a deusa poderosa e imortal desse mundo. A forma como ele é apresentado e os seus poderes, conseguem passar todo o temor necessário para o leitor ficar na dúvida sobre o destino final dos heróis. Mas, da mesma forma que Aelian, o general tem atitudes inexplicáveis.

Todos os outros personagens possuem seus problemas de construção, por aparecerem de forma rápida demais e permanecerem por pouco tempo na trama, sem dar chance do leitor criar um vínculo; ou por não ter uma presença que realmente importe; ou por, simplesmente, não servir para nada, a não ser morrer mais para a frente.

E é nesse ponto que começam os problemas, nessa tentativa do autor de transformar os personagens e a trama em algo grande, quando, na verdade, não passa de uma história de heróis contra vilões, sem muitas reviravoltas ou surpresas.

Aparição é um guerreiro que enfrenta o regime tirânico da deusa Una e de seu general. Ele causa diversos problemas, como ataques aleatórios em locais militares, ou ajuda pessoas que são perseguidas por soldados, independentemente do motivo. Ele tem um pacto com o general Proghon de um não combater o outro. Acontece que esse pacto não tem a menor lógica, já que Proghon é muito mais forte que Aparição, pode matá-lo a qualquer momento e não é apresentado um único motivo para que ele não faça isso. Simplesmente é dito que é assim e pronto, dando aquela sensação de que o autor mirou nos pontos em que os dois conversam, mas como não encontrou forma de fazê-lo de forma natural, criou esse subterfúgio do pacto.

Inclusive, a única arma capaz de matar Proghon fica em sua sala particular, onde ele fica meditando, de onde só se pode sair por uma porta. E o que Aparição faz? Invade essa sala acompanhado por um outro personagem sem qualquer capacidade de se defender e sem um plano de fuga, apenas para criar o momento em que o pacto será quebrado e a batalha acontecerá. Batalha essa que não tem motivo nenhum para já não ter acontecido antes.

Um outro personagem, Ziggy, um garoto dono de um monstro de estimação, aparece na trama de uma forma até convincente, mas depois disso, ele não é usado para nada, a não ser no final, em um destino construído apenas para emocionar.

Venoma, uma garota que faz a vez de assassina que se infiltra em qualquer lugar, é a relação afetuosa de Aelian. Mas ela aparece em um capítulo, no outro os dois já estão apaixonados, embora ela o trate igual lixo, e no outro já fizeram sexo e já estão lutando. Não existe uma construção da relação, fica algo superficial, apressado, embora sejam gastas páginas e páginas para descrever uma festa e diálogos sem qualquer função dentro da trama, como se o autor estivesse presente nessa ocasião, aproveitando a bebida, a música e as danças, enquanto o leitor é obrigado a assistir de fora, algo bastante chato.

O mesmo acontece com Harun, o anão da história, que em um momento é um vilão, no outro é mostrado como herói e no outro se torna vilão de novo, mas de forma que não convence em nenhum dos momentos. Inclusive, sua história é aquela que mais se aproxima da história de Gimli, de O SENHOR DOS ANÉIS. Em uma trecho, quando Aelian e Harun estão dentro de um corredor subterrâneo, achei que estava lendo uma cópia do livro de Tolkien.

Mas, apesar desses problemas, durante a leitura, como disse lá em cima, você encontrará partes muito boas que balancearão a qualidade da obra. Preciso acrescentar que a escrita do autor me surpreendeu e é boa o suficiente para conseguir deixar o leitor à vontade em um mundo estranho. Apesar do excesso de momentos e diálogos desnecessários, o autor sabe como escrever de forma a convencer o leitor a não desistir, e sabe como criar uma ação dentro de um ambiente que não se torne confusa ou difícil de imaginar. Isso é algo que muitos leitores famosos e mais experientes não conseguem fazer, ou seja, é algo para se elogiar e aplaudir.

E tem o fato de ser uma obra nacional que, como tantas outras, demonstra a capacidade de muitos de nossos autores atuais em igualar suas obras, ou mesmo superar, em termos de criatividade e qualidade com os autores de outros países, que são, muitas vezes, mais valorizados que os nossos.


AVALIAÇÃO:


AUTOR: Felipe Castilho
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2017
PÁGINAS: 448