Deka convive com o medo e a expectativa todos os dias. Finalmente chegou seu momento de passar pela cerimônia do sangue, à qual todas as meninas de Otera são submetidas. Se o seu sangue for vermelho, igual ao de qualquer humano, Deka enfim fará parte da aldeia que a ignora e a despreza desde seu nascimento, enfim será aceita, enfim viverá uma vida normal… Se o seu sangue fosse vermelho. Mas ele não é.
O sangue que escorre de suas veias é dourado, a cor da impureza. E, por isso, seu destino será enfrentar consequências ainda piores do que a morte. Até que uma mulher misteriosa aparece trazendo uma alternativa: lutar pelo imperador em um exército de garotas como Deka, as alaki, guerreiras quase imortais e, mais importante, dotadas de dons raros.
Juntas, as alaki podem conter a maior ameaça do império, os uivantes mortais, bestas selvagens que atacam de vilarejo em vilarejo, deixando dezenas de corpos em seu rastro. Em busca de sentir que pertence a algum lugar, Deka parte para a capital, onde logo descobre que nada é exatamente o que parece – nem ela mesma.
SANGUE DOURADO apresenta um mundo dominado pelos homens, onde as mulheres são subservientes, cobrem todo o corpo e rosto, caso sejam pessoas normais. Se o sangue delas for dourado, então são demoníacas e devem ser mortas. Elas possuem outro nome, alakis, e não são fáceis de matar, uma vez que se regeneram. A única forma conhecida é decapitação, afogamento ou cremação. É o que tentam fazer com Deka, depois que ela se revela uma alakis, só que Deka, para espanto de seus algozes, não morre.
Após nove tentativas, Deka é levada pela tal mulher misteriosa, que com o decorrer da trama, se mostrará bem mais do que aparenta inicialmente. Deka é levada para fazer parte do novo exército do imperador que marchará contra os uivantes. Todas são mulheres, todas são alakis, e mesmo sendo a última esperança de salvação de Otera, são tratadas de forma repugnante, violenta, pela população e por soldados humanos.
Deka começa como uma adolescente impregnada de medo. Ela só desejava ser normal, ser aceita. Mas isso nunca aconteceu, uma vez que ela é filha de uma mulher do sul, de pele negra, e o pai é descendente de uma alakis. E mesmo assim, quando Deka se descobre diferente, o pai é o primeiro a se voltar contra ela. Então, Deka não possui mais esperanças, mesmo quando aceita ingressar no exército do imperador, onde todas são como ela. Ou quase. Isso porque Deka possui algumas habilidades diferentes, desconhecidas, que parecem estar a desabrochar conforme ela envelhece.
No novo mundo, Deka faz amizade com Britta e Keita. Britta é uma alaki, que veio junto com Deka para o exército do imperador. As duas criam um laço de sangue, uma promessa de que uma sempre protegerá a outra. Já Keita é um soldado que passa a ser o braço direito de Deka. Ele teve a família assassinado pelos uivantes e vê nas alakis a arma perfeita para se vingar das criaturas. Como todos os homens de Otera, ele foi criado para odiar as alakis, mas não consegue nutrir esse sentimento por Deka. E, aos poucos, nem pelas outras como ela.
Com o avanço da história, Deka deixa de ser aquela adolescente insegura e se transforma numa líder, uma heroína capaz de guiar suas iguais para a liberdade e recuperar o que lhes foi tirado de forma traiçoeira, como ela descobre aos poucos. E surpresas não faltam em SANGUE DOURADO, uma vez que a história é recheada de segredos, que vão sendo revelados aos poucos, a cada capítulo, dando um panorama de como era o mundo de Otera no passado, de como ele se transformou no que é no momento, e de como Deka irá mudá-lo no futuro.
Existe a construção de um romance entre Deka e Keita, mas em nenhum momento se torna o foco da história. É apenas aquele tempero discreto, que permite alguma felicidade emocional a Deka, e também a demonstrar que em mundo corrompido pelo preconceito, é possível encontrar quem não seja. O principal da história é a força feminina, o direito de ser livre, independentemente do gênero, da aparência, da crença, da cor da pele ou de onde se nasceu.
SANGUE DOURADO é uma fantasia que lida com questões importantes como racismo, xenofobia, misoginia, desigualdade, abuso, machismo e preconceito. Alguns trechos são duros, violentos, realistas, não poupam descrição e detalhes. Mas a maioria deles não tem o peso de alguns diálogos, algumas frases proferidas pelo povo contra as mulheres, contra as alakis. Eles cortam o coração e causam repulsa, uma revolta imensa. E é muito fácil construir uma relação com nossa sociedade atual, sem nem precisar voltar ao passado. Hoje em dia, muitos dos diálogos do livro, são proferidos no dia-a-dia, basta acessar as redes sociais, sair à rua, ou mesmo no trabalho. É para se ler, para refletir, além de ser uma aventura que conquista a cada página. Uma das melhores do ano, sem dúvida.
AUTORA: Namina FORNA
TRADUÇÃO: Karine RIBEIRO
EDITORA: Galera
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 378
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