Na véspera do Natal de 1617, uma tempestade sem precedentes se formou repentinamente próxima à costa da ilha de Vardø, no extremo nordeste da Noruega. Quase todos os homens da ilha, 40 no total, estavam em embarcações de pesca no mar quando foram surpreendidos. Nenhum deles retornou com vida. A tragédia não se restringiu à perda das vidas, mas às dificuldades seguintes em um local que já era de poucas pessoas. Quase todos os habitantes da Vardø passaram a ser mulheres, algumas crianças, velhos e um padre.

O rei da Dinamarca-Noruega, Cristiano IV, era luterano ortodoxo e queria estabelecer sua religião por todo o reino e eliminar todas as influências de povos da Finamarca, uma área vasta, selvagem e em grande parte desprovida de governo. A maioria dessa população era indígena, para quem a conversa com espíritos eram práticas bastante comuns, e se recusou a obedecer às reformas religiosas do rei. Então, Cristino IV instaurou perseguições e massacres sobre a proteção do estado. Vardø está localizado na Finamarca.

Em 1619, dois anos após a tragédia em Vardø, o comissário Absalom Cornet recebe a ordem do rei para se instalar na ilha e estabelecer a conversão de todos os habitantes à religião oficial, além de averiguar a possível existência de bruxas. Caso se confirme, deverá julgá-las e condená-las. Antes de viajar, Cornet se casa com Ursula, a filha de um empresário à beira da falência.

Em Vardø, Ursula conhece mulheres que possuem conhecimento de seus corpos e de como ser mulher de uma forma que ela nunca imaginou. Mais ainda, Ursula conhece Maren, uma das locais, e as duas criam uma amizade que, aos poucos, se transforma em algo mais forte e emotivo. Enquanto isso, ela precisa lidar com um violento Cornet, que usa todo o seu poder para mudar a população de Vardø e matar quem ele acha que é herege e tem parte com o demônio.

VARDO – A ILHA DAS MULHERES é uma obra ficcional baseada em fatos reais. Os personagens não existiram da forma como são descritos no livro, mas existiram pessoas muito próximas a isso. A narrativa não é romântica na sua maior parte, e se mantém distante na maioria dos capítulos. Essa decisão se demonstra correta, uma vez que existem muitos trechos de enorme crueldade e que poderiam causar um incômodo ainda maior se fossem exagerados.

Um exemplo é a descrição da noite de núpcias de Ursula. Ela é uma mulher sem instrução, afinal em 1617 as mulheres eram proibidas para isso, sem amigas íntimas e com uma mãe longe de ser alguém presente. Ursula não sabe nada de seu corpo, além daquilo que ele demonstrou conforme se desenvolveu. Quando ela tem a primeira relação com o esposo, homem rude, frio, que não demonstra qualquer afeto, descobre como funciona um ato sexual. Acompanhar seus pensamentos e sentimentos é uma experiência triste, revoltante, ainda mais quando se considera o quão normal era esse desconhecimento na época. O mesmo pode ser dito dos atos bárbaros perpetuados por Cornet em Vardø.

A relação que Ursula e Maren criam conforme se conhecem, é a parte romantizada da obra, mas feita de uma maneira singela, carinhosa e cuidadosa. E ler esses trechos causam emoções conflituosas, uma vez que eles transmitem grande emoção, são as partes bonitas da obra, mas é óbvio que uma relação assim está fadada a ser trágica. A torcida fica para que o autor apresente uma solução que seja feliz para ambas, Ursula e Maren. E, de certa forma, isso acontece.

VARDO – A ILHA DAS MULHERES se passa em uma época que eu, particularmente, não consigo imaginar a intensidade de sofrimento e revolta. Uma época de monstros protegidos por uma falsa religião, com o único objetivo de conseguirem poder e matar todos os que são contrários à sua vontade. É uma leitura forte, intensa, que deixará você pensativo por muito tempo.


AUTORA: Kiran Millwood HARGRAVE
TRADUÇÃO: Flavia de LAVOR
EDITORA: Record
PUBLICAÇÃO: 350
PÁGINAS: 2021


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