Em 26 de dezembro de 1900, três faroleiros desapareceram de um farol remoto na ilha de Eilean Mòr, nas Hébridas Exteriores. Seus nomes eram Thomas Marshall, James Ducat e Donald MacArthur. O portão do farol estava trancado pelo lado de dentro. Faltavam dois dos três casacos dos faroleiros. A mesa da cozinha continha pratos servidos de comida. Uma das cadeiras estava virada, como se o ocupante tivesse se levantado às pressas. O relógio da parede estava parado, exatamente às 2 horas da madrugada.

Os diários do faroleiro-chefe continha relatos de ventos fortes como nunca tinha visto antes, só que a meteorologia não registrou nenhuma tempestade no local. O diário também indicava que os três homens sentiam medo da tempestade, mesmo estando em um local totalmente seguro. Nunca se descobriu o que realmente aconteceu, e o mistério perdura até os dias de hoje. O FAROL foi inspirado e escrito como homenagem respeitosa a esse acontecimento, mas é uma obra de ficção. Não há, portanto, qualquer semelhança com a vida desses homens nem com suas personalidades.

Em O FAROL, o desaparecimento ocorreu em dezembro de 1972. Quando a tripulação do barco de mantimentos chega ao farol, o capitão não encontra os três homens, Arthur, Bill e Vince. Porta trancada por dentro, cadeira tombada, comida nos pratos da mesa, relógio parado às 8:45 horas, diário relatando uma tempestade da qual não se tem registros de ter acontecido. A Trident House, empresa responsável pelo farol, inicia uma investigação, juntamente com a polícia, mas não encontram vestígios dos faroleiros.

Em 1992, vinte anos depois, o romancista Dan Sharp decide escrever e publicar uma história sobre o que aconteceu no farol. Para isso, ele entrevista as três viúvas: Helen, esposa de Arthur; Jenny, a esposa de Bill; e Michelle, a namorada de Vince. Mas essa iniciativa traz de volta vários traumas, sentimentos e emoções que estavam guardados. Além de que a Trident House paga uma pensão vitalícia às viúvas, desde que elas jamais compartilhem aquilo que sabem sobre o desaparecimento dos maridos. Mas existem verdades que não conseguem ficar ocultas.

O FAROL é um livro que mistura vários gêneros: drama, thriller psicológico, suspense e uma pequena, bem pequena, parcela de terror sobrenatural. Digo isso, porque é apenas uma pequena frase, que nem é formada por palavras de significado, a reprodução de um som. Um detalhe que é solto nas últimas páginas, que faz grande diferença e deixa aquele arrepio no braço. O restante da leitura, é sobre luto, sobre arrependimento, sobre fidelidade, sobre traição, sobre preconceito, sobre superação.

O casal Arthur e Helen são vizinhos do casal Bill e Jenny. Como o farol precisa estar sempre com três homens, Arthur e Bill nunca estão ao mesmo tempo em casa junto das esposas. Embora exista essa aproximação física e social, isso acaba se perdendo com o tempo, devido ao estresse, à solidão e à carência. Mais ainda devido a uma tragédia pessoal que abala Arthur e Helen permanentemente e que verbera no desaparecimento dos homens anos depois.

Vince possui um segredo que esconde da Trident House. Aliás, esconde de todos, menos de Michelle. Apesar disso, ele é um homem íntegro, honesto, com um passado abalado por uma fraqueza momentânea, mas que lhe custou muito e comprometeu seu futuro. Só que esse passo retorna para cobrar uma dívida, e o fato de Vince estar em um farol isolado e afastado do litoral, de difícil acesso, não impede que seja encontrado.

Após o desaparecimento dos maridos, Helen, Jenny e Michelle se afastam de forma permanente. Aquilo que elas sabem está cheio de cobrança, de mágoa, o que torna impossível que sejam amigas. Helen é a única que tenta uma reaproximação, é a única que sabe o significado da hora em que o relógio parou, e ela é a dona do motivo do tal evento com características de terror do final da história. Jenny acredita que Bill está vivo em algum lugar, ela ainda ama o esposo, mesmo depois de descobrir sua maior traição. E Michelle continuou com sua vida, apesar de carregar o fardo do tal segredo de Vince.

As páginas finais de O FAROL apresentam uma resposta para o que aconteceu com os três homens. Parte dessa resposta é o resultado de tudo o que foi relatado antes, uma consequência óbvia. A outra parte, é o tal toque sobrenatural, pequeno, mas que faz toda a diferença.

Por último, preciso referenciar a narrativa, que navega entre o passado e o presente, em capítulos alternados entre 1972 e 1992. Os de 1972 são em primeira pessoa, cada um narrado por um dos faroleiros. Os de 1992 se dividem em primeira pessoa, quando a narrativa é das esposas, e em terceira pessoa, quando é sobre algo que elas não presenciaram. Criativo é o diálogo das esposas com o escritor, que também tem um segredo. É contínuo, sem pausas e sem participação do interlocutor. Achei bastante interessante.

Como resultado final, O FAROL é um livro intenso em várias vertentes, que surpreende conforme a história da vida de cada personagem é destrinchada, principalmente os trechos de Arthur e Helen e a tragédia que eles enfrentam em determinado momento da vida. Inclusive, essa é a parte mais triste e mais pesada da história. Algo que realmente abalaria qualquer um. E é assustador como isso vai afetar o destino dos homens lá no fim. Muito bom!


AUTORA: Emma STONEX
TRADUÇÃO: Carolina SELVATIC e Diego MAGALHÃES
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 352


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