O livro JOGADOR NÚMERO UM é um frescor de criatividade que deixa um sorriso no rosto de qualquer um que tenha aproveitado a cultura pop dos anos de 1980 a 1990, mas também de quem nasceu após esse período e se fascina com a quantidade e a qualidade do que se produziu nessas duas décadas e que reverbera até hoje em muita coisa que é criada. É uma história bem fechada que não precisava de uma continuação. Claro que com o sucesso do livro e a posterior adaptação cinematográfica, nas mãos de um dos melhores diretores de todos os tempos, Steven Spielberg, o autor se renderia à “necessidade” de continuar as aventuras de Parzival, Art3mis, Aech e Shoto.

Começo de forma ambígua ao afirmar que JOGADOR NÚMERO DOIS é um ótimo livro ao mesmo tempo em que não é assim um ótimo livro. Nesta continuação, nós vamos conhecer tudo o que aconteceu após o final do primeiro livro, com Wade assumindo o manto de senhor absoluto de OASIS, o universo virtual lotado de conhecimento e cultura, além de dono das empresas e da fortuna deixadas pelo falecido criador, James Halliday. Não demora muito para Wade descobrir que existe uma versão atualizada de OASIS, uma interface neural que permite ao usuário usar os cinco sentidos no ambiente virtual e controlar seu avatar apenas com o pensamento. Também é possível gravar suas experiências no mundo real e reproduzí-las no virtual para que outras pessoas consigam revivê-las. É praticamente uma reprodução do real dentro do virtual, de uma forma que o cérebro não é capaz de diferenciar.

Entretanto, essa tecnologia tem suas consequências. Existe um limite de tempo que o cérebro humano suporta a conexão e é necessário criar travas de segurança para que as pessoas não se viciem e esqueçam de desconectar quando estão próximas desse limite. Devido a isso e a outras questões morais, os quatro amigos divergem se devem ou não ativar a INO. A desavença é tão grande, que Samantha abandona Wade e se isola, enquanto Wade e os outros prosseguem com o lançamento da tecnologia, que rapidamente ganha o mundo.

Com o lançamento da INO, duas surpresas acontecem: a primeira, é a mensagem de Halliday sobre uma nova corrida em busca de “easter eggs”, com a promessa de uma recompensa misteriosa; a segunda, é a aparição do avatar de um determinado personagem, que consegue se apossar do poder de Wade de controlar OASIS e ameaçar não apenas o mundo virtual, mas também o mundo real, caso Wade não encontre a tal recompensa misteriosa e a entregue para ele. Então, começa uma nova jornada, onde os quatro amigos precisarão unir forças e esquecer as brigas para salvarem o mundo.

JOGADOR NÚMERO DOIS tenta ser maior e melhor do que o primeiro livro, mas é uma tarefa ingrata, porque o principal mérito de JOGADOR NÚMERO UM é a novidade, a criativa ideia de transportar os personagens para o meio de séries, filmes e jogos dos anos de 1980, interagindo com os mesmos, como se fizessem parte deles, para procurar por pistas. Só que isso não é mais novidade, e o que o leitor acompanha, ele já leu no livro anterior. Apenas as referências são novas, de outras séries, outros filmes, outros jogos.

Um outro ingrediente que se perde na continuação é a ansiedade pela formação do par romântico, Wade e Samantha, além da formação do quarteto de amigos. Embora eles estejam numa situação de confronto por quase metade da história, é evidente que eles irão se reunir para enfrentar o desafio, então o interesse meio que se perde na falta de expectativa. O mesmo se pode dizer para o vilão. É caricato e clichê. O próprio Wade afirma isso em um trecho do livro, quando dispara palavras na cara do vilão dizendo que ele age da mesma forma que diversos outros já conhecidos. É legal ver essa similaridade, mas também quebra o interesse, não existe novidade e também se sabe qual será o desfecho.

Até mesmo quando JOGADOR NÚMERO DOIS tenta discutir a definição de vida, se algo virtual que pensa e reproduz sentimentos, pode ser considerado como algo que vive, em igualdade com os seres humanos, passa longe da profundidade que tal tema necessita. E mesmo essa ideia não é nova, pelo contrário, já existe em dezenas de livros e ficção-científica. E desse tema, o que se salva, é a luta de dois personagens secundários, que se tornam a força motora da história, para ficarem juntos, mesmo sabendo que isso pode ser algo impossível.

JOGADOR NÚMERO DOIS, se considerado de forma isolada, é um ótimo livro. Eu esperava que o segundo nível da aventura trouxesse mais novidades ao invés de outra corrida por “easter egss”. Mesmo assim, o resultado é que a leitura diverte, a edição da Intrínseca está espetacular, capa dura, miolo todo elaborado com lindos detalhes temáticos, e sempre é uma delícia revisitar OASIS e tudo o que ele proporciona em termos de cultura pop. Da mesma forma que aconselhei na resenha do primeiro livro, pesquise todas as referências na Internet, a sua experiência será muito mais completa e gratificante.


AUTOR: Ernest CLINE
TRADUÇÃO: Flora PINHEIRO, Giu ALONSO
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 416


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