Um grande e completo caos em todos os sentidos e direções, isso descreve bem UMA TOCHA NA ESCURIDÃO, segundo livro da saga de distopia criada por Sabaa Tahir. Os segredos carregam um peso enorme e as revelações farão a todos saírem da zona de conforto. Mas, infelizmente, a maestria presente no primeiro livro da saga, não está presente aqui, vamos descobrir o porquê disso!

Por se tratar de uma análise do segundo livro da saga, o texto pode vir conter spoilers do livro anterior, UMA CHAMA ENTRE AS CINZAS (resenha aqui).

Um novo imperador tomou posse, Elias estava prestes a ser executado e Helene se viu obrigada a ser braço direito desse novo imperador sanguinário e violento. Porém, Laia e a resistência botam em prática um ataque na execução, levando um grande caos para o império. E no meio dessa confusão, Laia e Elias conseguem fugir, podendo partir agora para uma nova missão, o resgate de Darin, irmão de Laia, que está preso e que contém informações que irão mudar completamente o rumo do império, podendo dar esperança aos oprimidos. Para Helene, resta a missão de ir à caça de Elias, o preço para o não cumprimento dessa tarefa é a aniquilação de toda a sua família, mas ela ainda ama Elias, é possível superar esse amor pela segurança de sua família?

A maior novidade do livro é que temos um novo ponto de vista para acompanhar. Em UMA CHAMA ENTRE AS CINZAS, a história era contada através de Elias e Laia, mas agora, além desses dois que retornam, mais uma personagem ganha espaço para se desenvolver. Helene, a amiga de Elias e agora Águia de Sangue, braço direito do imperador sanguinário, recebe capítulos de ponto de vista e seu olhar é muito importante para acompanharmos o que está acontecendo no império e nas redondezas. Seus pensamentos nos apresentam uma mulher forte que está divida entre o amor e o dever, mas dá pra chamar de dever ordens que ela tem que seguir contra a sua vontade? Através dos seus olhos também é possível ter um panorama sobre a rebelião que está acontecendo e que está para piorar, com até mesmo famílias importantes pegando em armas contra esse demoníaco imperador. São as melhores passagens do livro que se provam necessárias e bem desenvolvidas.

É interessante notar que UMA TOCHA NA ESCURIDÃO se inicia exatamente do caos onde o anterior se encerrou. O ataque deu certo, pegou todos os Marcias de surpresa e deu tempo para Laia fugir, mas essa fuga não foi fácil. Praticamente as primeiras cem páginas são usadas para essa fuga desenfreada que reserva apenas perigos a cada esquina. Eles estão sendo caçados sem piedade pela Comandante, a Mãe de Elias e também a mulher mais perigosa e demoníaca do império. Mas por incrível que pareça, a fuga parece estar correndo fácil demais e até mesmo o encontro com a Comandante e a posterior luta que Elias tem com sua própria mãe, parecem ter corrido sem maiores problemas. Mas a Comandante não iria se permitir errar dessa forma e o que ela quer mesmo é que todos achem que ela se descuidou. Esses capítulos são bastante poderosos e eletrizantes, muita coisa está em jogo e o rumo de tudo muda em seguida, mas infelizmente o livro não acompanha essa crescente de qualidades e já nas páginas seguintes, a autora se revela sem controle sobre sua própria história.

A missão de fuga acabou, mas agora os personagens precisam chegar nessa distante e remota prisão, onde o irmão de Laia está. Para isso, eles vão para pequenas cidades atrás de reforços e os problemas começam aqui. Esses reforços são alguns dos novos personagens, que além de não serem apresentados com muito cuidado, acabam ocupando muito tempo na trama, jogando os personagens principais para o banco de reservas. Nessa altura do campeonato, a última coisa que o leitor precisava era uma interminável apresentação de novos personagens que não tem carisma algum. A importância deles na trama também é questionável e isso tudo já acende um alerta no leitor, que começa a se preocupar se esse livro vai conseguir se encerrar com qualidade e sentido.

Um ponto extremamente irritante são as passagens de tempo que acontecem a toda a hora, sem sutileza alguma e até mesmo sem sentido. Tudo bem que os personagens estão percorrendo uma grande distância e não dá pra detalhar tudo, mas a autora desenvolve esses saltos temporais de algumas semanas no meio de eventos enormes e importantes, e quando os personagens voltam, parece que nada daquele caos anterior teve importância ou relevância, simplesmente tudo correu bem, e como correu bem? Não sabemos, porque a autora não nos fala.

A falta de clareza no plano dos personagens também é muito incomoda, pois eles estão saindo de um lugar perigoso e indo para outro dez vezes mais, porém eles não tem um plano e vão naquele esquema de na hora a gente resolve, e não preciso nem falar que nunca nada se resolve. Todas as tramas construídas e planejadas pelo livro dão errado e ninguém cumpre o que fala. O leitor se sente um idiota por torcer por uma coisa, uma coisa não, várias coisas, e do nada a autora vem e muda todas as regras do jogo. Tudo bem fazer isso uma vez ou outra, mas fazer isso no livro todo? Aí é brincar com a nossa paciência.

Uma decisão na narrativa que pessoalmente testou minha paciência é no fato de toda a hora a trama mentir sobre o destino de algum personagem, fazendo a gente acreditar que uma coisa grande aconteceu no final de determinado capítulo, para no próximo, a gente ver que aquilo era mentira. Mentiram na nossa cara e isso não tem sentido na trama, a mentira presente aqui é apenas para deixar o leitor doido para ler o próximo capítulo, a mentira não é inserida na trama em algum personagem ou com algum sentido, é apenas um gancho barato para atrair a nossa atenção. Novamente, fazer isso uma vez, tudo bem, mas fazer isso toda a hora é um risco que a autora correu e não o superou.

O desfecho passa longe de ser satisfatório para o tamanho do caos que a autora foi desenvolvendo até aqui. Não existe um ápice decente e o embate dos personagens é um banho de água fria. A união entre o épico medieval, com a magia, passa do ponto na narrativa, com a mesma sendo usada no final para tapar buracos. Algum personagem num problema sem solução? Não se preocupe, tire alguma desculpa envolvendo magia da cartola. Faltou um entrosamento melhor dentro na narrativa para problemas como esses não parecerem soluções gratuitas.

Infelizmente a tocha na escuridão se apagou. Começou sensacional e terminou de forma fraca. Aquele tipo de história incrível que não soube dar continuidade à grandeza que foi iniciada no livro anterior. Impossível não pensar que a autora deu um nó tão forte na sua própria história e que em seguida ela não conseguiu desamarrar a linha. Uma sequência totalmente decepcionante e insossa, só não se torna pior graças às suas primeiras cem páginas incríveis e para o trio dos personagens principais que dispensam comentários. Mas talvez nem tudo esteja perdido, eu acredito que o próximo volume possa botar ordem na casa, só nos resta torcer por isso!


AUTORA: Sabaa TAHIR
TRADUÇÃO: Jorge RITTER
EDITORA: Verus
PUBLICAÇÃO: 2017
PÁGINAS: 430


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