O envolvimento militar americano direto na Guerra do Vietnã foi encerrado formalmente em 15 de agosto de 1973. Não demorou muito tempo e na primavera de 1975, os norte-vietnamitas iniciaram uma grande ofensiva para anexar o Sul de uma vez por todas. Em abril de 1975, Saigon foi conquistada pelos comunistas, marcando o fim da guerra, com o Norte e o Sul do Vietnã sendo formalmente unificados no ano seguinte. Foi nesse cenário que a família de Thi Bui, a autora de O MELHOR QUE PODÍAMOS FAZER, fugiu do Vietnã e se refugiou nos Estados Unidos.

Em 2005, Bui teve seu primeiro filho, e com a maternidade, nasceu um desejo de compreender seus pais, suas origens, os fatos que ajudaram a moldar o caráter e as decisões dos dois. Para isso, Bui precisou voltar ao passado, através dos relatos das memórias que eles tinham desde a infância. Esse projeto foi inicialmente iniciado como um livro, mas ele não representava verdadeiramente o sentimento que Bui queria transmitir. Assim, ela decidiu transformar tudo em uma HQ, onde poderia desenhar os locais e as emoções de cada pessoa de sua família, além das dela própria.

O traço de seus desenhos é simples, mas muito competente no que deseja transmitir. Embora faça tudo no preto sobre branco, ela adicionou apenas a cor vermelha espalhada pelos quadrinhos, muitas vezes sem um objetivo estético, mas como uma nuvem que sempre rodeia toda a sua vida. É difícil compreender o que Bui deseja passar. Normalmente o vermelho representa sangue, perigo, mas não sei se esse é o objetivo. Com base em toda a história passada no Vietnã, o vermelho pode significar uma dezenas de coisas diferentes, ou mesmo todas elas. Acho que seu significado será diferente para cada leitor.

O MELHOR QUE PODÍAMOS FAZER é uma HQ totalmente autobiográfica e bastante pessoal. Não existe espaço para qualquer traço de ficção, e a narrativa feita por Bui é totalmente de pesquisa sobre seus pais e tudo o que aconteceu até aquele momento em que ela virou mãe. A relação dela com os pais não é fácil, cheia de pequenas mágoas, muito por causa da insistência dos dois em manter uma cultura rígida e intransigente quanto a estrangeiros, e isso se torna muito complicado quando eles vivem em um país estrangeiro.

Bui e sua família ao chegarem nos EUA não tiveram apenas que superar os traumas de tudo o que enfrentaram, mas também se adaptarem a um povo completamente diferente, e mais, em uma época que também foi traumática socialmente e politicamente para os americanos, por causa de guerra e de todo o conflito que ela gerou dentro do país. Bui saiu de um inferno para cair em um local onde muitas pessoas os viam como inimigos, ou com suspeitas.

A leitura de O MELHOR QUE PODÍAMOS FAZER não é fácil. A vida que os pais de Bui enfrentaram antes de se tornarem adultos, e após, é algo difícil de compreender, de aceitar, que causa desconforto. São situações que que beiram o absurdo, desde abandono, sequestros, fugas, pobreza extrema, guerra, mortes, corpos pelas ruas, viagens no meio de batalhas armadas, entre muitas, muitas outras situações que são difíceis de absorver. É uma leitura que abala o psicológico, que exaure as forças.

O MELHOR QUE PODÍAMOS FAZER não é apenas uma busca de Bui por quem são realmente os pais, ou mesmo por quem ela é, mas uma forma de equilíbrio psicológico e emocional, uma forma que ela encontrou de conseguir ter uma visão de qual tipo de mãe ela seria para seu filho recém nascido. Nos EUA, Bui estudou Artes e Direito e pensou em se tornar uma advogada de direitos civis, mas, em vez disso, virou professora de escola pública na Califórnia. Esta é sua primeira HQ, e ela serve de aprendizado para se conhecer como é possível suplantar sacrifícios terríveis para conseguir salvar uma família.


AUTORA: Thi BUI
ILUSTRADOR: Thi BUI
TRADUÇÃO: Fernando SCHEIBE
EDITORA: Nemo
PUBLICAÇÃO: 2017
PÁGINAS: 330


COMPRAR: Amazon